Equidade racial e voluntariado empresarial

Por: Silvia Naccache, Guilherme Françolin
06 Julho 2020 - 00h00

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Para superarmos a condição de um país tão desigual, a questão racial é certamente um dos temas que precisa receber toda a dedicação Atualmente, mais da metade (50,7%) da população brasileira é negra, e mais de 70% dessa parcela vive em situação de extrema pobreza. Os negros representam 71% das vítimas de homicídio e 61,6% da população carcerária. Um jovem negro é assassinado a cada 23 minutos no país, e 65,3% das mulheres que morrem vítimas de agressão no Brasil são negras.

Compreender que existe desigualdade por conta da cor da pele e aceitar que o racismo existe é o primeiro passo para buscar a equidade racial. A abolição da escravatura no Brasil aconteceu há mais de 130 anos, em 13 de maio de 1888, mas diferenças sociais e econômicas entre negros e brancos continuam enormes. Mesmo os negros sendo metade da nossa população, ainda são minoria nos cargos mais importantes de empresas e nas salas de aulas das universidades, tanto como alunos quanto como professores. Temos ainda poucos negros ocupando espaços de poder e muitas dificuldades de acesso e desenvolvimento no mercado de trabalho. As oportunidades são absurdamente distintas. Se por um lado não aparecem nessas posições, são a maioria em julgamentos e acusações injustas, além de serem vítimas de homicídios.

Incluir o tema da diversidade racial nas empresas é fundamental. Estrategicamente, o voluntariado empresarial pode ser ferramenta para promover a equidade e o conhecimento e sobre o tema. As empresas fortalecem as iniciativas promovidas por organizações negras ou lideradas por negros, fomentam o empreendedorismo e promovem a quebra de um paradigma de que no Brasil exista uma convivência harmoniosa entre todas as raças e que não existe racismo. Sabemos que isso é um mito. Ainda temos uma sociedade preconceituosa e buscamos soluções paliativas.

A Consultoria Santo Caos vem trabalhando o tema e mapeando as diversas variáveis que impactam no engajamento dos empregados com as empresas. Algumas são previsíveis: salário, benefícios, comunicação, liderança etc. Outras, nem tanto.

É o caso, por exemplo, da diversidade racial e do voluntariado corporativo. Em 2017, foi realizado um estudo que recebeu o nome de Além do Bem. Ao longo das 828 entrevistas e questionários aplicados, foi possível identificar o impacto do voluntariado empresarial no engajamento dos empregados, bem como os diversos perfis de voluntários que existem hoje nas empresas. A investigação trabalhou com a hipótese de que os voluntários são pessoas mais engajadas que a maioria. Afinal, fazem o que fazem sem nenhum tipo de remuneração. Mas será que isso se reflete no engajamento com a empresa?

As descobertas mais relevantes do Além do Bem mostraram que não somente o voluntário desenvolve uma relação mais de troca que de doação (envolvendo aprendizado, empatia, desenvolvimento de competências, etc.), mas que participar de ações de voluntariado pela empresa aumenta, em média, 16% seu engajamento com a corporação onde trabalha, em relação aos não-voluntários.

Por coincidência ou não, 16% também foi o aumento médio de engajamento observado nos empregados (negros e não-negros) de organizações que valorizam a diversidade racial, em comparação com as que não a praticam. Este foi o principal achado de outro estudo, chamado “Black In”, que contou com a colaboração da Faculdade Zumbi dos Palmares. O estudo teve a participação de quase 1.800 entrevistados de mais de 150 empresas, e especialistas de 25 instituições ligadas à equidade racial no Brasil.

O que é possível encontrar de ponto convergente entre essas descobertas é que tanto o voluntariado quanto a diversidade impactam diretamente em vários indicadores de engajamento.

O Índice de Engajamento Santo Caos© é composto por cinco pilares, ou conexões entre pessoas e empresas:

1) Conscientização: o quanto pessoas e organização conhecem uma a outra e entendem seu papel nessa relação;

2) Compromisso: o quanto ambas as partes estão dispostas a cumprir seu papel e fazer a relação funcionar;

3) Pertencimento: o quanto funcionários e empresa se identificam e dão voz um ao outro;

4) Orgulho: qual o nível de reconhecimento e propósito entre ambas as partes; e

5) Compartilhamento: a extrapolação da relação inicial, em que a pessoa passa a ser porta-voz da empresa e vai além do seu job description.

 

Esses cinco pilares são diretamente impactados tanto pela diversidade racial quanto pelo voluntariado corporativo. A conscientização aumenta, pois a organização passa a conhecer melhor seu público interno e a respeitar suas particularidades, ao passo que a pessoa entende melhor onde a empresa quer chegar. Há um estímulo do compromisso quando existem metas estabelecidas em relação à diversidade e aos programas de voluntariado. O pertencimento cresce, pois as pessoas passam a se integrar e trabalhar melhor em equipe, seja porque se promoveu a construção de uma equipe com mais diversidade racial, seja porque se formaram times de voluntários. Acontece um aumento substancial do orgulho, pois todos passam a ter uma clareza de propósito e de que juntos estão construindo algo relevante para a sociedade. Por fim, com esses valores bem estabelecidos, o compartilhamento é afetado pela maior tendência de se falar e divulgar positivamente as iniciativas da organização.

Trabalhar diversidade racial e voluntariado de maneira conjunta, portanto, pode potencializar ainda mais esses gatilhos de engajamento. Já parou para pensar num grupo de afinidade racial podendo realizar ações voluntárias em organizações ou comunidades predominantemente negras? Ou, num movimento contrário, a convivência com grupos periféricos estimulando a criação de um programa estruturado de voluntariado, com impacto social real e mensurável?

Sem dúvida, as possibilidades são muitas, e os dados estão aí para comprovar a potência da diversidade, do voluntariado e do engajamento. A igualdade só se consolidará quando as medidas de equidade forem tomadas. O voluntariado nos permite participar ativamente dessa causa, promovendo mais oportunidades para todos.

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