Teresa Costa D´Amaral

Por: Rigeria Salado
01 Novembro 2006 - 00h00

Teresa Costa D’Amaral sempre se interessou pela área social. Recebeu bons exemplos dos pais e aprendeu com a família o valor do respeito ao próximo e da solidariedade. Assim, desde cedo sabia que queria trabalhar em prol da comunidade, contribuindo para o crescimento da sociedade brasileira. E, mais tarde, teve este ideal confirmado sendo mais do que uma escolha e, sim, um comprometimento pessoal.
Suas vivências anteriores trouxeram-lhe a convicção e a experiência necessárias para o desenvolvimento de um projeto de sucesso no Terceiro Setor. Ela foi criadora e primeira coordenadora da Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Corde), órgão federal ligado à presidência da República, e também autora e responsável pela tramitação e promulgação da lei federal no 7.853/89, que trata das obrigações da administração federal para com as pessoas portadoras de deficiência, determina a defesa de seus direitos coletivos e difusos pelo Ministério Público e criminaliza o preconceito.
Em 1998, ela fundou o Instituto Brasileiro de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD), no Rio de Janeiro. A idéia era criar uma ONG que pudesse atender os portadores de deficiência física em suas necessidades de forma profissional e não assistencial, como até então eram conhecidas as entidades que prestavam atendimento a este público no Brasil.
Pensando dessa maneira, o IBDD foi criado para prestar serviços a partir de três núcleos de atuação: trabalho, defesa de direitos e esportes. Além dos cursos técnicos, os interessados são preparados para o convívio social e integrarem o mercado de trabalho. Empresas também são beneficiadas por uma consultoria especializada na inserção de portadores de deficiências nas atividades trabalhistas, identificando o perfil do candidato certo para o perfil da vaga oferecida. O núcleo de esportes incentiva a prática desportiva e a participação em competições como,
por exemplo, as para olimpíadas. E o núcleo de defesa de direitos é especializado na legislação e na defesa de direitos da pessoa com deficiência, atuando através de ações individuais e coletivas.
Por sua dedicação e notoriedade junto à causa, Teresa Costa recebeu o prêmio Mulheres mais influentes do Brasil 2006 no mês de novembro. Esta foi a terceira edição do concurso que destaca as formadoras de opinião do ano em 15 categorias. Desta vez, das 46 homenageadas pela revista Forbes, ela ganhou na categoria Terceiro Setor.
Nesta entrevista à Revista Filantropia, Teresa Costa fala sobre inclusão social da pessoa com deficiência no Brasil e dos projetos desenvolvidos pelo IBDD.

Revista Filantropia: Fale resumidamente sobre sua carreira.

Teresa Costa: Minha formação e vida profissional tiveram a marca de um grande senso de responsabilidade e de vontade de participar da construção de um Brasil mais justo. Desde as primeiras escolhas, nelas sempre pesou uma realização pessoal que passava por contribuir de alguma forma para uma mudança social.
Considero como maior prêmio na minha carreira poder ter contribuído decisivamente com a edição da lei nº 7.853. Essa é uma marca permanente, um prêmio excepcional para quem tem, como eu, uma alma que pensa sempre em justiça, em empreender e inovar.
Pude assim, através de uma legislação transformadora, liderar silenciosamente, mas de forma decisiva, uma nova postura do governo e da sociedade brasileiras em relação às pessoas com deficiência.

Filantropia: Quando começou a sua relação com o setor social? Qual a razão de seu envolvimento especificamente com as questões das pessoas com deficiência?

TC:
Sou de uma geração marcada pelo compromisso político com o Brasil. Meus pais tiveram sempre a presença da responsabilidade social na nossa vida. Esse
engajamento, definido pelo social, foi aos poucos se viabilizando por uma descoberta de duas mãos. Primeiro, a necessidade de descobrir uma profissão que me realizasse e me desse a alegria da responsabilidade cumprida. Segundo, que essa escolha tivesse a força de um compromisso pessoal.
O fato de ter crescido com uma irmã com paralisia cerebral severa e de mais tarde ter tido um sobrinho com Trisomia 21 (Síndrome de Down) confirmaram definitivamente minha escolha.
Tenho consciência de que usar minha capacidade profissional e pessoal para mudar
uma questão social até bem pouco tempo “inexistente” para a sociedade brasileira, e cuja invisibilidade, dura de ser combatida, ainda permanecerá por longos tempos através das marcas do preconceito e do desconhecimento. Penso que é minha melhor contribuição para mudar a vida de parte das cerca de 18 milhões de pessoas com deficiência brasileiras.

Filantropia: O que motivou a fundação do IBDD?

TC: Em primeiro lugar, a constatação de que pessoalmente eu desejava um
trabalho mais permanente, no qual meus projetos e minhas construções não se apagassem no tempo de um governo ou de um emprego. Em segundo lugar, era preciso tentar fazer alguma proposta diferente de trabalho com o deficiente no Brasil. Era preciso mostrar que a mudança é possível e que construir a cidadania do deficiente nem custa milhões de dólares nem necessita de programas sociais complexos. O que é imprescindível é a mudança do olhar. É a transformação do nosso olhar e a criação de um sentimento, de um movimento, de igualdade e solidariedade.

Filantropia: Quais são os diferenciais do instituto, principalmente em relação às entidades assistenciais de atendimento à pessoa deficiente?

TC:
O IBDD é um trabalho de cidadania. E o nosso diferencial é que entendemos essa construção como um trabalho conjunto no qual o deficiente é o condutor.
Para podermos realizar bem essa missão produzimos um novo diferencial, somos uma instituição filantrópica que vive de recursos próprios, arrecadados com prestação de serviços e essa característica nos dá um terceiro diferencial, somos independentes.
Mais diferenças? No IBDD, todo serviço prestado à pessoa com deficiência é gratuito. E cada atendimento é realizado com a maior eficiência possível. No IBDD ninguém espera para ser atendido e a primeira entrevista é feita sem hora marcada.
Todas essas marcas fazem o perfil do IBDD: uma associação que trabalha pelos
direitos dos deficientes sem concessões.

Filantropia: Fale sobre os principais projetos desenvolvidos pelo instituto e seus resultados.

TC:
Temos atuação em três áreas: direitos, trabalho e esporte. Esses projetos
formam o propósito de atuar diretamente na produção de cidadania através de: preparação para o trabalho e emprego, reivindicação e consolidação de direitos individuais e coletivos através de ações e de participação política, quebra da invisibilidade da questão através do potencial de transformação individual e da beleza da prática esportiva. Já atendemos 20.361 pessoas, aproximadamente
três empresas são atendidas por dia e empregamos 1.096 pessoas com deficiência.
Profissionalizamos 2.147. Impetramos quase 300 ações individuais e uma ação coletiva, esta pela acessibilidade nos transportes coletivos no Rio. O centro do resultado desses projetos é a mudança de postura das pessoas atendidas.
Recebi uma vez o depoimento de uma aluna do curso de Orientação Profissional
dizendo que “o IBDD fez uma revolução em minha vida”. Era isso que queríamos.
É por isso que lutamos.

Filantropia: Quais as características do trabalho com pessoas portadoras de deficiência? E qual o perfil do público atendido pelo instituto?

TC: A maior característica do nosso trabalho é desenvolver na pessoa com deficiência que nos procura um novo olhar sobre si mesma, seus problemas, sua vida. E isso pode ser construído através dos nossos diversos programas, de diferentes formas, mas sempre direcionado pela necessidade de cidadania e autonomia da pessoa atendida.
O perfil das pessoas que nos procuram é heterogêneo, mas por causa de nossos programas, o público jovem e adulto é nossa principal clientela. (Veja quadro abaixo)


Filantropia: Quais as competências procuradas pelas empresas em um processo de seleção de profissionais com deficiência?

TC: As empresas, em princípio, procuram profissionais competentes, ponto. E
deve ser assim para o processo ter um bom resultado. Mas é importante, e o IBDD
tem tido sucesso nessa área através dos cursos de orientação profissional, procurar
profissionais com deficiência que além de responder ao perfil profissional demandado tenham boa postura atitudinal, equilíbrio nas relações interpessoais e compromisso com seu trabalho.

Filantropia: O mercado de trabalho é democrático, ou há preferência ou preterição por pessoas com um determinado tipo de deficiência?

TC: O mercado de trabalho é, em princípio concorrência. Além disso, as características de cada empresa se refletem no processo de empregar pessoas com deficiência. Significa que a maioria das empresas, por limitações arquitetônicas ou por medo do desconhecido, prefere selecionar pessoas com deficiências leves, de preferência físicas. Pessoas com deficiências mais marcantes como cegos e
usuários de cadeiras de rodas encontram uma dificuldade muito maior na busca
por emprego.

Filantropia: Como autora da lei federal nº 7.853/89, a senhora classificaria como satisfatória a legislação brasileira que trata dos direitos da pessoa com deficiência?

TC: Considero que temos boas legislações nos três níveis: federal, estadual e municipal. Duas das mais importantes ONGs internacionais que trabalham com o tema, a Disabled People International (DPI) e a Rehabilitation International (RI) avaliaram o Brasil como um dos países latino-americanos mais avançados em termos de legislação sobre o tema. Mas, e a realidade? Entendo que temos
dois problemas importantes a serem transpostos: primeiro nossa mania de esperar uma regulamentação para tudo, o que é uma forma de protelar a efetividade da lei. E depois aquela prática brasileira inconcebível em uma verdadeira democracia de que nem toda lei é para ser cumprida.
Se a lei 7.853 fosse cumprida, o Brasil seria exemplar para com seus deficientes.

Filantropia: Qual a sua visão a respeito do atendimento prestado pelo Estado às pessoas com deficiência?

TC: Desacredito profundamente na ação do Estado. Exemplifico com o direito
de ir e vir, sagrado em uma democracia e desrespeitado cotidianamente pelos governantes brasileiros em relação à acessibilidade nos meios de transporte coletivos e nas vias públicas para as pessoas que usam cadeiras de rodas.
Em geral, o Estado Brasileiro e seus representantes ainda não entenderam que o deficiente é um cidadão brasileiro como qualquer outro. E um cidadão com todos os direitos e deveres. O Estado ainda entende seu atendimento como ato de favor. Políticos o usam em gestos de oportunismo eleitoreiro. Sou extremamente cética quanto a um engajamento maior e mais permanente do Estado.

Filantropia: A senhora considera adequada a exposição que a mídia em geral dá à questão do deficiente?

TC: Entendo que a mídia em geral contribui significativamente para a invisibilidade
da questão quando não enfoca mais freqüentemente nossos temas. Mas nesse círculo vicioso de estar na mídia porque é notícia e não estar na mídia e não ser
notícia, quem sai perdendo é o deficiente e a democracia.
Cabe a nós, ONGs atuantes na área, trabalhar para romper essa invisibilidade
que faz com que a questão só interesse aos próprios deficientes e suas famílias. Produzir e divulgar conhecimento na nossa área é raríssimo. E a existência e sobrevivência de mídias como a Revista Filantropia, especializadas em temas do Terceiro Setor ou no tema deficiência, não refutam mas, sim, comprovam essa afirmação. Tão ou mais significativo é o fato de os grandes meios de comunicação de massa apenas tangenciarem esporadicamente o assunto. Abordagens viciadas pelo assistencialismo e caridade tiram o foco imprescindível da cidadania da pessoa com deficiência.

Filantropia: Como a senhora encara a proliferação de entidades sociais focadas no atendimento à pessoa deficiente?

TC: Vejo nela uma resposta a uma demanda reprimida e não respondida pelos
governos. Em alguns casos, serviços prestados pelos governos foram sucateados.
As ONGs devem fazer esse atendimento, sim. Não em lugar do Estado, mas ocupando o espaço vazio de omissão e desleixo deixado pela grande maioria dos governos. Sempre percebendo que o Terceiro Setor não é, não pode ser e nem quer ser Estado.

Filantropia: Quais são os motivos de sua luta atualmente?

TC: Preparo, com muita alegria, a criação de uma Rede Social IBDD. Formato, atuação, relacionamentos inovadores estão em pauta para esse desenho. O IBDD tem brasileiro no nome e esse é o próximo desafio: encontrar formas de espalhar nossa proposta de maneira engajada e com resultados concretos para a cidadania do deficiente.

Filantropia: A senhora está envolvida em outros projetos sociais?

TC: Não estou. Sou obsessiva com o tema das pessoas com deficiência. Penso e trabalho nele 48 horas por dia. Não me sobra tempo para outros projetos, o que não significa que o IBDD não procure sempre uma integração com outros projetos sociais e mantenha uma postura multidisciplinar na abordagem de seus projetos e atuações.

Filantropia: Na sua opinião, qual é o segredo do setor social e qual a sua importância numa sociedade democrática?

TC: Acredito que o segredo do setor social é estar perto do homem, do cidadão, sabendo que é em cada comunidade que nossa vida é vivida.A grande força do Terceiro Setor é acreditar no homem, apostar na sua autonomia e investir na construção conjunta de sua cidadania. Uma democracia só existe quando cada um de nós é capaz de ter as rédeas de sua vida e ser cidadão. O Brasil, infelizmente, ainda não soube acreditar nem na capacidade de todos os seus cidadãos, nem na força do Terceiro Setor para a construção de sua democracia.

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