ODED GRAJEW

Por: Daniela Tcherniacowski
01 Setembro 2004 - 00h00

Ex-presidente da empresa de brinquedos Grow, fundador da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente e do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, idealizador do Fórum Social Mundial e ex-assessor especial do governo Lula. Esta é uma pequena mostra do currículo extenso de Oded Grajew, um homem que sempre esteve engajado em prol de uma sociedade melhor, hoje considerado uma das maiores referências mundiais quando o assunto é responsabilidade social empresarial. Notabilizado pelo trabalho de mobilização junto aos empresários, e por sua capacidade de articulação entre diversos atores sociais, Oded foi chamado pelo presidente Lula para atuar no Planalto Central, justamente para aproximar Estado, sociedade e empresas, além de estabelecer parcerias entre estas três esferas. De volta à presidência do Instituto Ethos, depois de dar a tarefa no governo como cumprida, continua, mais do que nunca, trabalhando pela causa da transformação social. Entre as ações mais recentes, destaca-se a liderança no lançamento, em agosto deste ano, da Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade, que divulga e sensibiliza toda a sociedade em torno das Metas do Milênio, estabelecidas pela ONU em 2000, e subscritas por 191 países, incluindo o Brasil. O evento ocorrerá a cada ano, em todo o país, quando serão realizados debates e ações práticas sobre os temas da cidadania e solidariedade.
Em entrevista exclusiva à Revista Filantropia, Oded Grajew aborda, entre outros assuntos, a importância de todos nesse movimento na direção de uma sociedade justa e sustentável.

Revista Filantropia: Em que momento se encontra o movimento de Responsabilidade Social Empresarial no Brasil?
Oded Grajew: Estamos na segunda etapa de nossa missão. Avançamos muito em fazer as empresas adotarem uma gestão socialmente responsável e, agora, trabalhamos para que sejam parceiras na construção de uma sociedade justa e sustentável, o que significa buscar a transformação social. Também pretendemos constituir, em todo o Brasil, fóruns empresariais de apoio às comunidades locais, a exemplo do grupo de São Paulo. Mais recentemente, participamos do lançamento da Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade, a fim de direcionar as empresas a atender às Metas do Milênio, já que a ONU definiu ser esse o eixo do século para a humanidade, uma vez que ela corre novos riscos ambientais e sociais, de degradação, e até de extinção da espécie humana, caso estes objetivos não sejam alcançados.

Filantropia: Estamos mesmo num momento limítrofe da humanidade? Questão para a qual, inclusive, o senhor chama atenção em seu artigo no livro "Práticas de Cidadania"?
OG:
Há várias pesquisas que apontam o fim dos recursos naturais daqui a 30 anos. A conseqüência é de que metade da população mundial não terá acesso, por exemplo, a água potável, tão importante para a vida humana. O aquecimento global é outro fator preocupante, responsável pelo degelo das calotas polares, destruição da biodiversidade, desequilíbrio biológico do planeta e pela transformação de terras agricultáveis em desertos. Podemos acreditar ou não nisso. Em São Paulo, muita gente não acreditava no que iria acontecer com os rios Pinheiros e Tietê, e veja no que deu. Além disso, há os riscos sociais, como o aumento permanente na distância entre ricos e pobres. É um ambiente propício para conflitos sociais e o crescimento de movimentos marginais e terroristas. Os riscos são realmente enormes, portanto, como os pesquisadores divulgam.

Filantropia: Como as empresas estão incorporando as Metas do Milênio em função dessa necessidade urgente de transformação social?

OG: Primeiramente, elas estão conhecendo as metas. Há empresas que já fazem trabalhos diversos, mas a idéia é alinhar estrategicamente essas ações. Isso é uma coisa muito nova, sendo que vários empresários estão ainda pensando em como se estruturar. Nos próximos anos, em virtude de novas edições da Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade, devemos começar a avaliar os resultados das iniciativas em torno das metas.

Filantropia: As empresas ainda estão muito voltadas para a comunidade ao abraçarem uma causa socialmente responsável?

OG: Quando criei a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente, era difícil para as empresas entenderem até mesmo a questão dos investimentos sociais, da participação na comunidade. Depois, houve uma fase em que realmente foi implementado o conceito de ação social da empresa, como investimentos na comunidade e apoio a projetos sociais. A ação da empresa na comunidade é muito importante, especialmente num país como o Brasil, com tantas carências sociais. Já com o surgimento do Ethos, ampliamos essa idéia para abranger todas as atividades da empresa e outros públicos, como os funcionários, os fornecedores, os clientes etc. Isso também foi entendido pelas empresas, mas muitas ainda ficam na ação social. De qualquer forma, é preciso entender que a responsabilidade social é um processo de evolução.

Filantropia: O que agregou à missão do Instituto Ethos a criação do Uniethos?

OG: Hoje, as empresas entendem a responsabilidade social e querem adotar e aprofundar o tema. Entretanto, detectamos nelas uma grande necessidade de apoio mais próximo e individualizado na implementação do conceito. O Uniethos veio exatamente responder a isso. Ele é nosso braço educacional para formar consultores e profissionais para apoiar as empresas e gerar casos de referência em responsabilidade social corporativa.

Filantropia: Já se fala na criação de uma ISO de responsabilidade social. Essa norma pode ajudar a reforçar os valores da RSE?

OG: Sim, porque a norma é didática, explica como a empresa pode obter qualidade na responsabilidade social. A ISO também assegura credibilidade para aquelas que tenham real compromisso com o tema. É uma ferramenta bastante importante porque estimula as empresas a adotarem um critério de compras, por exemplo, baseado em fornecedores certificados com a norma. Da mesma forma que pode balizar investidores na escolha da aplicação de recursos.

Filantropia: As ferramentas de gestão do Instituto Ethos vão ser utilizadas para a definição da ISO?

OG: Não só as ferramentas, mas todo o nosso know-how e capacidade de mobilização e visibilidade. O intuito é que a norma saia em 2005 ou 2006.

Filantropia: Ao mesmo tempo, existem alguns projetos de lei sobre responsabilidade social tramitando na Câmara dos Deputados. O Ethos foi chamado para participar dessa discussão?

OG: Não só o Ethos não foi chamado, como várias outras entidades e as próprias empresas. É uma iniciativa de alguns deputados interessados em incorporar uma lei ao currículo, sem realmente chamar a sociedade para participar do processo. Esse projeto deve ter ampla participação de todos, para que não seja mais uma lei a não ser cumprida.

Filantropia: Estamos em ano de eleições e o Ethos lançou uma cartilha para as empresas sobre como podem se colocar a respeito do tema. Qual a importância da participação das empresas no processo eleitoral?

OG: A publicação "A Responsabilidade Social das Empresas no Processo Eleitoral" faz as companhias pensarem sua forma de atuação e se questionarem sobre o processo eleitoral. O que queremos mostrar é que nada escapa à responsabilidade social empresarial. Em função disso, muitas delas estão analisando se devem ou não apoiar candidatos. Porque aqui no Brasil é muito comum a prática de financiamento ilegal de campanhas eleitorais, sem o devido registro. A cartilha ainda indica como as empresas podem envolver seus funcionários no debate sobre as eleições, pois acreditamos que é preciso transformar a empresa numa escola de cidadania.

Filantropia: Como o senhor vê o Terceiro Setor no Brasil?

OG: As entidades que compõem o Terceiro Setor estão em fase de reflexão de suas ações. Com a volta da democracia, houve um crescimento muito grande de organizações da sociedade civil, que agora analisam o fator qualidade. Elas estão questionando quem é o Terceiro Setor, a quem se destina, quem faz parte, que tipo de organização necessita, se a regulamentação que existe é a ideal, qual deve ser a estrutura legal da entidade. É, ao mesmo tempo, um momento de moralização. Existem entidades sérias e produtivas, mas também o oposto. Outro debate é sobre qual a ação mais efetiva para a melhoria da sociedade, e isso inclui a relação das entidades com governos e empresas.

Filantropia: Da sua experiência como administrador, o que o senhor pode dizer sobre a gestão das ONGs? Elas ainda têm o que aprender?

OG: Um grande desafio para as ONGs é aplicar a própria missão à gestão. Exemplo disso é um sindicato realizar o que ele mesmo propõe para as empresas em relação aos funcionários. Nesse sentido, as organizações precisam ser fiéis aos valores que defendem.

Filantropia: Fale sobre sua experiência no governo federal.

OG: Meu papel era fazer a interação entre governo e sociedade com a classe empresarial. Eu realizava palestras e argumentava que o Brasil tem todos os recursos para sanear seus problemas. E quando se consegue estabelecer pontes e parcerias entre poder público, empresários, ONGs e sociedade em torno de um objetivo comum, é possível resolver todas as questões do país.

Filantropia: E por que sair do governo, então?

OG: Quando o presidente falou comigo era para atuar no começo do mandato, articulando governo e sociedade, especialmente as empresas. Assim, foi constituído o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, que une a sociedade civil e o governo. Também foi criada a ONG Apoio Fome Zero, de empresários empenhados em ajudar o Estado no combate à fome. A partir do momento em que esses e outros programas foram postos em andamento, como o das cisternas no Semi-Árido, o Banco de Alimentos, as bibliotecas, os restaurantes populares, o Primeiro Emprego, achei que havia percorrido uma etapa. Então conversei com o presidente e disse que iria continuar com esse trabalho, mas não necessariamente no poder público.

Filantropia: O que significa o lançamento do GRI, em português, para o avanço do conceito de responsabilidade social?

OG: O GRI é uma iniciativa de várias entidades, entre elas o Instituto Ethos, para criar uma linguagem universal de indicadores e modelo de balanço social, da mesma forma que acontece com os indicadores financeiros e econômicos. O lançamento em português vai nos permitir trabalhar em conjunto para que haja uma interação entre indicadores Ethos, GRI e outros. O objetivo é chegarmos a um padrão por volta de 2006. Esse é um dos grandes desafios da responsabilidade social empresarial no mundo.

Filantropia: O Brasil está próximo desse nível internacional de indicadores e balanço social?

OG: O Brasil é uma referência internacional, tendo participado como convidado de vários fóruns pelo mundo sobre responsabilidade social empresarial. Somos exemplo não só em estratégia e mobilização, mas em produção de conhecimentos na área. Estamos bastante avançados nesse sentido. O que falta é traduzir essa experiência numa relação concreta de transformação social. Para tanto, os governos, o Congresso e a câmara de vereadores e de deputados são fundamentais, mas ainda têm muito a percorrer. Isso ocorre tanto em relação à aplicação da responsabilidade social no próprio sistema governamental - na relação com funcionários e com o meio ambiente, por exemplo - quanto em políticas voltadas para o desenvolvimento sustentável.

''As Metas do Milênio estabelecidas pela ONU são os eixos para a humanidade, que corre riscos ambientais e sociais, até mesmo sua própria extinção''

Campanha das Metas do Milênio

Estabelecidos pela Organização das Nações Unidas – ONU, os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio são a base da Semana Nacional pela Cidadania e Solidariedade, lançada em agosto deste ano no Brasil. A campanha, que teve Oded Grajew como um dos líderes, visa sensibilizar governos e sociedade brasileira no cumprimento das metas. Mais informações no site.

www.nospodemos.org.br

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