Interpretações sobre o Código Civil: especialmente X exclusivamente

Por: Laís Figueirêdo
01 Setembro 2006 - 00h00

Uma associação pode deliberar sobre alteração estatutária e outros assuntos em uma mesma assembléia geral? Em tese, sim. Mas, na prática, aconteceu de um cartório denegar o registro dos atos societários de uma associação sob o argumento de que o art. 59 do Código Civil, com as alterações da Lei nº 11.127/05, determina que a assembléia geral que deliberar sobre a alteração de estatuto social deve ser convocada apenas com este intuito.

O que diz o art. 59? Compete privativamente à assembléia geral: I- destituir os administradores; II- alterar o estatuto. Parágrafo único. Para as deliberações a que se referem os incisos I e II deste artigo, é exigida deliberação da assembléia especialmente convocada para esse fim, cujo quorum será o estabelecido no estatuto, bem como os critérios de eleição dos administradores.

Em primeira análise, o cartório considerou que especialmente significava exclusivamente. Entendimento este, ao nosso ver, equivocado. O termo “especialmente” descrito no código visa resguardar a transparência dos atos de destituição de administradores e de alteração estatutária, fazendo com que seja obrigatória a especificação, no edital, do motivo da assembléia. Quando a lei diz “assembléia especialmente convocada para esse fim” não tenciona determinar que haja apenas a deliberação de um assunto na reunião, mas sim que este seja um assunto destacado em pauta com expressa previsão, dada a relevância de tais matérias.

É essa relevância que torna necessário que todos os associados estejam cientes com antecedência e no momento em que são informados da realização da Assembléia, para que não haja manipulação de opiniões por desconhecimento do conteúdo do assunto tratado. Contudo, não há qualquer justificativa, legal ou lógica, que impeça que outros assuntos também sejam deliberados juntamente a esse tema

Ações necessárias
Complementando a legislação aplicável com diretrizes norteadoras para melhor compreensão do caso, trazemos a lume recomendações do Código de Melhores Práticas de Governança Corporativa do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), dentre as quais ressaltamos a de que a pauta de uma assembléia geral “não deve incluir o item ‘outros assuntos’, para evitar que temas importantes não sejam revelados com a necessária antecedência”.

A cartilha de recomendações da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre Governança Corporativa prevê que o edital de convocação de assembléias gerais deve conter descrição precisa dos assuntos a serem tratados para “facilitar a participação (...), assegurar a perfeita informação (...) sobre os assuntos a serem tratados em assembléia e permitir que o maior número possível de assuntos de interesse da companhia seja submetido à assembléia geral, evitando convocação de novas assembléias”. Essas práticas corroboram o entendimento de que o edital de convocação deve conter a pauta pormenorizada de assuntos específicos e não excludentes, para que não se desperdice a oportunidade de reunião dos membros.

No caso concreto, convocou-se assembléia geral ordinária e extraordinária, explicitando a pauta de deliberações que seriam tratadas no dia. Afirmar que as assembléias não poderiam ser realizadas em conjunto, ou que não estariam autorizadas a deliberar sobre nenhum outro assunto quando estivesse em pauta um tema de competência privativa, como a alteração do estatuto, seria ir de encontro ao princípio de economia processual de atos administrativos.

Ensina Luiz Rodrigues Wambier, no seu Curso Avançado de Processo Civil1, sobre o princípio da economia processual, que este deve inspirar tanto o legislador como o operador do direito a obter o máximo rendimento com o mínimo de dispêndio. Diz o Código de Processo Civil, no seu art. 154, que “os atos e termos processuais não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir, reputando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial”.

Teoria e prática
Buscando regras análogas na Lei nº 6.404/76 que disciplina as sociedades por ações, encontramos a distinção entre assembléia geral ordinária e extraordinária, sendo a primeira a que tem por objeto as matérias definidas no seu art. 132: tomada de contas, destinação do lucro e distribuição dos dividendos, eleição de administradores, correção do capital social; e a segunda nos demais casos. O parágrafo único deste artigo expressamente autoriza que uma assembléia geral ordinária e outra extraordinária podem ser cumulativamente convocadas e realizadas no mesmo local, data e hora, instrumentadas em ata única, hipótese exata do caso apresentado. O silêncio do Código Civil sobre esta possibilidade soa-nos como permissão tácita, confirmada pela analogia dos sistemas.

Quem vive a realidade das organizações sabe que envolver e garantir a participação dos associados em assembléias na maioria das vezes não é uma tarefa simples. Nos casos em que é intenção deliberar sobre pautas ordinárias e extraordinárias, o edital de convocação já prevê que serão as duas assembléias em conjunto, da qual, de praxe, se lavra uma única ata para registro. Não é, pois, razão formalmente expressa em lei – nem que seja interpretativa pela prática ou costume – que determine ser vedada a eleição de diretoria junto com a reforma do estatuto, por exemplo. Por força de lei, os estatutos sociais devem, sim, garantir a competência privativa da assembléia geral para destituir administradores e alterar o estatuto, as quais deverão ser decididas em assembléias que as visibilizem.

Exigir que exista uma assembléia para deliberar sobre temas ordinários e outra apenas para discutir alteração estatutária ou destituição de administradores poderia inviabilizar a realização de processos deliberativos, sendo provável, como conseqüência, o desmembramento da mesma reunião em dois editais, duas listas de presenças e duas atas, encarecendo os custos do registro de documentos e criando uma situação fictícia com a finalidade exclusiva de apaziguar entrave burocrático proposto pelo administrador do registro. Ao final, o cartório acatou nossa argumentação e arquivou os documentos societários como apresentado.

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