Mais difundido em grandes empresas privadas, mas também ganhando espaço no setor público e entre as organizações sociais, o compliance vem se tornando tendência como uma estratégia para atestar a retidão das corporações, conferindo a elas mais transparência, solidez e valor junto à sociedade, independente de seu segmento de atuação.
O termo compliance vem do verbo em inglês to comply, que significa cumprir, obedecer, agir em conformidade. É por isso que muitos usam a palavra integridade, ou ainda conformidade, no lugar de compliance aqui no Brasil, facilitando seu entendimento.
O compliance é um conjunto de medidas implementadas em uma instituição para garantir princípios éticos, normas legais e regulamentares, políticas e diretrizes estatutárias. Sua importância é tamanha que já há legislação a respeito, incentivando as instituições a criarem seus programas de conformidade, como a Lei 12.846 de 2013 e o Decreto federal 8.420 de 2015, que dispõe: "programa de integridade consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com o objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira."
"O compliance é uma ferramenta de importância superlativa para mostrar que a organização está aberta ao seu público, da forma mais transparente possível."
Airton Grazzioli – Ministério Público do Estado de São Paulo
Algo decisivo para sua implementação é a mudança da cultura institucional, partindo do compromisso pleno da alta administração corporativa. "O passo mais importante para que uma organização da sociedade civil possa implantar um programa de compliance de sucesso é a vontade de instrumentalizar a instituição com ferramentas inteligentes e envolver todos os agentes da organização, tanto internos como externos, na política de mudança", explica Airton Grazzioli, membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, titular do cargo de promotor de justiça de fundações da capital. Ainda seguindo esta ideia, para Luiz Fernando Nóbrega, consultor e compliance officer, conhecimento é indispensável neste processo. "A atuação de um profissional especializado e a colaboração de uma pessoa interna que conheça a entidade e suas fraquezas são essenciais", afirma.
A partir daí, o programa de integridade, chamado também de programa de conformidade, começa a tomar forma visando melhorias contínuas em gestão, governança e imagem.
"Em pouco tempo, assim como tantos avanços, como as formas de prestação de contas e auditoria externa, o compliance será essencial no dia a dia das instituições."
Ricardo Monello – Advocacia Sergio Monello e Audisa Auditores e Consultores
Três eixos norteiam o trabalho de compliance: prevenção (quando são avaliadas as possíveis ameaças à organização, instituídas as regras internas baseadas no código de conduta e de ética, criadas as medidas de controle interno e instauradas as formas de treinamento e comunicação), detecção (quando são monitoradas todas as ações realizadas, criados os canais para denunciar irregularidades e controladas as negociações com terceiros) e ação (quando acontecem as investigações internas e externas, são aplicadas as medidas contra as violações e feitas auditorias permanentes como forma de revisar o programa e propor melhorias).
Entre todas estas etapas e ações, vale destacar que o programa deve ser feito sob medida para cada organização e de acordo com suas necessidades. "Por mais parecidas que sejam ou atuem na mesma área, cada entidade é única, tem sua história e suas particularidades. Desta forma, cada uma deve ter seu próprio programa de compliance", destaca Alexandre Chiaratti, auditor especialista em compliance e sócio da Audisa Auditores e Consultores. E pode ser instituído em qualquer entidade sem fins lucrativos. "A adoção do programa de compliance aplica- -se a todas as organizações do Terceiro Setor, independente do porte, patrimônio, receita ou despesa; mesmo para aquelas que não demandam de verbas ou recursos públicos", explica Ricardo Monello, advogado, contador, sócio da Advocacia Sergio Monello e da Audisa Auditores e Consultores. "Evidente que uma grande organização pode aplicar ferramentas de controle e transparência mais sofisticados. As médias e pequenas, por seu turno, podem adotar medidas mais simples, mas que podem garantir a mesma eficiência em termos de controle e transparência", acrescenta Grazzioli.
Mesmo sabendo da importância em minimizar possíveis riscos e preservar a reputação da própria entidade e de seu pessoal, há quem adie a decisão de aderir às ações de integridade por questões orçamentárias, mas, segundo Chiaratti, este é um grande perigo. "Muitas entidades ainda não adotaram nenhuma ação no sentido do compliance porque dizem não ter verba; porém não percebem os riscos aos quais estão sujeitas e que os prejuízos podem ser muito maiores que o investimento necessário para a adoção de todas as medidas na linha do compliance", enfatiza.
"Implementar de qualquer jeito não resolve. Hoje, se exige efetividade no programa de compliance. Isso significa fazer o certo, sempre. E requer dedicação e tempo."
Luiz Fernando Nóbrega – Compliance Officer
Ainda que haja indecisos ou aqueles que preferem postergar a implantação do programa de integridade em sua organização, gestores como o Enilson Komono apostam verdadeiramente nesta ideia. "Com certeza a adoção de um programa de compliance bem adaptado à nossa realidade será de grande valia para a manutenção dos serviços de qualidade que prestamos", conta referindo-se à Wise Madness, uma instituição social de Bauru/SP que atende centenas de crianças e adolescentes por meio de oficinas de artes, esportes e cultura e da qual é um dos fundadores e coordenadores gerais. "Entender os riscos e eliminá-los ou amenizá-los é sempre uma forma de amadurecimento, tanto para gestores, quanto para funcionários e voluntários. E o compliance nos oferece essas ferramentas", reitera otimista com o programa que está sendo elaborado atualmente para a entidade, que também mantém uma casa abrigo e um centro de ressocialização de adultos.
Atuando diretamente com a Wise Madness, o consultor Luiz Fernando Nóbrega também espera bons resultados com a parceria. "É um trabalho desafiador porque a entidade está começando do zero. Mas, como há um alto grau de comprometimento por parte da diretoria, os frutos serão excelentes", enfatiza.
Compromisso da alta administração
Precisa ser explícito e irrestrito, garantindo condições, recursos e efetividade ao programa.
Participação de todos
Inclui estatutários, colaboradores, voluntários, prestadores de serviços e parceiros que precisam estar informados e envolvidos em todo o processo.
Acompanhamento técnico
È importante o acompanhamento de um profissional da área (compliance officer) em todo o processo para assegurar o sucesso da implantação e os resultados positivos do programa.
"O programa de compliance tem que ser de fácil entendimento, prático e possível de ser executado."
Alexandre Chiaratti – Audisa Auditores e Consultores
Nova conduta (apoio da alta administração + normas éticas) |
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Comitê de Compliance (todos os envolvidos + mecanismos para garantir a integridade) |
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Formalização + Implantação + Disseminação |
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Monitoramento + Aperfeiçoamento constante |
Mais de 350 pessoas, entre autoridades, dirigentes de entidades, advogados e profissionais ligados ao Terceiro Setor se reuniram em São Paulo, no dia 29 de agosto, para debater o tema "Ética e Integridade para um novo Brasil", com destaque para o compliance, no 10º Encontro Paulista de Fundações. O evento aconteceu no Espaço Sociocultural – Teatro CIEE e foi realizado pela Associação Paulista de Fundações (APF). Para Dora Silvia Cunha Bueno, Presidente da APF, as discussões sobre o assunto contribuem para que mais informação chegue às entidades sociais. "Alcançamos nosso maior objetivo que foi a disseminação dos conceitos de compliance às principais lideranças do Terceiro Setor. Assim, esperamos que, juntos, sejamos a alavanca e exemplo para uma nação próspera, justa e desenvolvida", ressalta.
"Sempre será positivo adotar programas de compliance, ainda mais no Terceiro Setor que tem tanta relevância social."
Vivian Sueiro Magalhães – AACD
Com sede em São Paulo e unidades espalhadas pelos estados de Minas Gerais, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Pernambuco e Rio Grande do Sul, totalizando 11 centros de atendimento, a Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) foi uma das primeiras instituições sociais a adotar um programa de compliance no Brasil, em 2013, tornando-se referência no tema. "Pessoas com grande relevância dentro da área de compliance viram na iniciativa da AACD uma vanguarda no Terceiro Setor e enaltecem nossa preocupação com a lisura e a transparência na utilização de verbas públicas e de qualquer recurso que a instituição receba", afirma Vivian Sueiro Magalhães, gerente de auditoria interna e compliance da AACD.
Como dicas para as entidades que ainda não possuem um programa de compliance estruturado, a gerente da AACD reforça a importância da adesão da alta administração às mudanças, sugere investimento em treinamento de colaboradores como ação preventiva para ajustar e fortalecer os aspectos positivos da cultura organizacional e faz recomendações: "Não façam compliance sem se preparar, sem entender o que é e quais os processos que precisam ser adotados. E jamais aceitem pacotes prontos de compliance porque tudo depende das necessidades das suas organizações".
Devido à crescente preocupação com a ética e a transparência nas ações, adotar medidas que assegurem a integridade das instituições acaba gerando valor à marca social. "Hoje, as organizações que possuem um sistema de compliance se apresentam perante à sociedade com um diferencial, que agrega valor a elas. No futuro, não muito distante, não haverá espaço para aquelas organizações que não ostentarem um sistema bastante efetivo nesse sentido", aponta Airton Grazzioli.
Para Monello, o tema está cada vez mais em pauta mundo afora, confirmando a sua relevância. "Tenho participado de eventos, dentro e fora do Brasil, e é nítida a preocupação dos dirigentes de entidades, apoiadores, financiadores e representantes dos órgãos públicos com o assunto", afirma e ainda acrescenta: "Muitas organizações sociais são escolhidas para parcerias e doações em função da existência de seu programa de compliance. Muitos órgãos públicos (secretarias e prefeituras) já estão estabelecendo normas que exigem que as entidades e empresas parceiras tenham obrigatoriamente um programa de compliance como condição à contratação."
"Descobrimos o compliance como uma ferramenta de grande valor para o nosso crescimento saudável."
Enilson Komono – Wise Madness
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