O poder das entidades sobre a política de governo

Por: Marcos Biasioli
01 Abril 2006 - 00h00

No dia 22 de maio, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por iniciativa da Comissão de Direito do Terceiro Setor, promoveu um caloroso debate acerca do desenvolvimento social do Estado e suas políticas sociais. O tema debatido pela mesa diretora foi “O poder das entidades beneficentes de assistência social sobre a política de governo”, que será também o ponto cume do presente artigo.

O professor Celso Ribeiro Bastos, citando Jorge Miranda1, aduz que “Estado é comunidade e poder juridicamente organizados”. Acareando esse pensamento com a Constituição Federal, encontramos no seu art. 3° que o Legislativo, o Judiciário e o Executivo compõem os poderes da União.

Em outras palavras, formam o poder juridicamente organizado. Já a comunidade, é indiscutivelmente o povo, que junto com os três poderes constitui o Estado. O Judiciário é o mandatário da comunidade para preservar seus direitos, o Legislativo é o anfitrião da regulação dos direitos e o Executivo coloca em prática tais direitos por meio de uma política democrática.

Considerando que o Brasil adotou como regime de governo a República, dirigida por um presidente, insta destacar que ele assume uma dualidade de papéis, ou seja, chefe de Estado e chefe de governo. A chefia de Estado visa a representação externa e interna da unidade do Estado, e a chefia de governo implica na liderança da política nacional2.

Quanto à chefia de Estado, a comunidade tem pouco a interferir, ante a soberania por ela mesma outorgada ao seu mandatário. Porém, quanto à chefia de governo, que implica na outorga de poderes para a adoção de políticas democráticas com a finalidade de implantar a justiça social, a ela cabe não só interferir como também delinear os parâmetros de tais políticas. Para tanto não se pode perder de vista a máxima: “Todo poder emana do povo”.

Nesse divisor de poderes do mandatário – que é o presidente da República –, há de se afirmar que o Estado democrático de direito implementou, entre outras, ao menos duas políticas: de Estado e de governo. Dada a outra  máxima que externa que “o poder corrompe”, a política de Estado é justamente aquela que traça limites à política de governo – pois ela deriva do mandamento constitucional – e impõe regras e procedimentos para a aplicação das metas legais em benefício da comunidade. Possui como principal característica a sua perenidade e não está vinculada a qualquer ideologia que não aquela outorgada pelo povo.

Política de Estado
Como exemplo de política de Estado, podemos destacar o regramento constitucional previsto no art. 196, que prevê: “A saúde é um direito de todos e dever do Estado”. Outro exemplo encontra-se no art. 205, que disciplina: “A educação, direito de todos e dever do Estado”. E mais, dispõe o art. 213: “Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei”. Enfim, a lei maior introduz ao chefe de Estado e de governo uma política uníssona a ser por ele implementada.

Ante os parâmetros da política de Estado, o seu chefe poderá adotar uma política própria para implementá-la. Eis, então, a denominação de política de governo, que nada mais significada que um sistema de gestão de política de Estado. Em outras palavras, ao governo cabe implementar aquilo que está determinado na lei, ainda que seja por meio de uma metodologia por ele elaborada, com a ajuda de seu ministério.

Política de governo
A título de exemplo de política de governo, podemos destacar os programas sociais já vistos pelo Brasil, como Bolsa-Família, Horta Comunitária, Programa Aquisição de Alimentos, Programa Universidade para Todos (Prouni) e Sistema Único de Assistência Social (Suas). Ocorre que a liberdade outorgada ao homem público, a começar por sua imunidade e foro privilegiado de julgamento, muitas vezes se sobressai à política de governo, alijada à política de Estado, dando passagem a vaidades, ideologias partidárias, promessas de campanha, palanques eleitoreiros e tantas outras.

Não só quando há exacerbação da política de governo em detrimento da política de Estado, mas em especial quando ela existe, a comunidade organizada pode e deve exercer a prerrogativa de seu direito no sentido de exigir a retomada do cumprimento da política de Estado, sob pena da derrogação dos poderes de seu mandatário.

Poder
Eis então a razão do título: “O poder das entidades sobre a política de governo”. A comunidade organizada, por meio das entidades sociais, é pessoa legítima a exigir o cumprimento pelos representantes do Poder Executivo, não só na órbita federal, mas em especial nas searas estadual e municipal, acerca da implementação da política de Estado ora prevista na Constituição Federal.

Relevando que tanto a Constituição Federal como também a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas)3 parametrizam a política social de Estado – definindo quem são os beneficiários da promoção, a forma de custeio de tais ações em nome do Estado, a participação das entidades sociais como intermediárias da política e outras regulações – não há como conceber a inércia do povo à impunidade dos ladinos do erário público, em detrimento da obra social.

A sociedade organizada, muitas vezes em face de desconhecer os meandros da via punitiva do chefe de governo, que promove a tergiversação da política de Estado, acaba declinando seu direito e se refestela apenas na teoria do “passar o pires”, visando colher quirelas para a obra social e manter a política da boa vizinhança, e, assim, acaba por colocar um Band-Aid na responsabilidade social do Estado.

Aceitar, por exemplo, o atendimento de pacientes financiados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ao custo imposto pelo gestor, permitir a falência da instituição hospitalar em nome do Estado e aceitar ainda óbito por falta de estrutura e medicamentos implicam não só na quebra da responsabilidade civil objetiva do dirigente, mas também do chefe do governo, que caso instado a socorrer a entidade de saúde, ironizou o problema com sua inércia.

A entidade de assistência social que padece em face da não-ajuda financeira do Estado para a consecução de seus fins sociais e nada faz para exigir a implementação da política de Estado, levando a instituição ao escabroso estado de calamidade da coabitação, alimentação, cuidados médicos e outros de seus assistidos, é tão comparsa ao descaso com a pessoa humana que o próprio chefe do governo.

O exercício do poder das entidades beneficentes se faz pelo controle jurisdicional da administração pública, que pode ser exercido de várias formas. No âmbito extrajudicial, por meio de um acirrado controle da renda pública e dos critérios de sua repartição. E na seara judicial, deve se valer dos instrumentos jurídicos já insertos no mapa processual para a exigência da implementação da política de Estado, entre eles: ação popular, ação de obrigação de fazer, mandado de segurança (na hipótese da resistência da autoridade co-autora negar a repartição do recurso público), ação civil pública (por meio do Ministério Público)
e ações de natureza criminal.

Enfim, é hora de se quebrar o velho paradigma acima que aduz “o poder corrompe”, substituindo-o por “o poder constrói o bem”.

 



Regras básicas sobre como utilizar o poder
  • Integração com o Conselho Municipal de Assistência Social.
  • Participação nas reuniões do conselho que possuem como pauta o fundo de assistência social.
  • Verificar a lei orçamentária do município, a fim de identificar a destinação de recurso para o social, e caso seja ínfima ou não esteja prevista, deve haver reação extra e/ou judicialmente na busca de uma melhor otimização orçamentária.
  • Interceder junto ao representante político local para inserir na Lei Federal de Diretrizes Orçamentárias o orçamento para a assistência social local.
  • Participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.
  • Acessar com freqüência os sites www.transparencia.gov.br, http://siops.datasus. gov.br e www.fnde.gov.br, além das páginas dos ministérios e secretaria estaduais, para verificar a dotação orçamentária devida ao município e para qual fim, a guisa de identificar recursos para o social e por supedâneo para a entidade beneficente.
  • Exigir a cotização dos custos dos programas sociais, de saúde e educação, dos chefes de governo, nos âmbitos municipal, estadual e federal, de forma extra e/ou judicial.
  • Continuar a produzir o bem!

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