A nova moda corporativa, agora, é o termo ESG, acrônimo para as iniciais das palavras Environmental, Social e Governance. A disseminação desse termo objetiva lançar luz sobre o tema da governança ambiental, social e corporativa.
Para compreender melhor esse movimento, tanto do mundo corporativo como por parte das organizações de impacto, é necessário que se faça uma breve recapitulação histórica do campo de impacto socioambiental desde o meio do século passado.
Após a Segunda Guerra, em 1948, foi publicada a Declaração dos Direitos Humanos, que pautou muitas discussões que vieram nas décadas seguintes. O Apartheid, que esteve em vigor oficialmente entre 1948 e 1994, ativou questões relacionadas à raça. Nos anos 1960, a segunda onda feminista já emergia.
Foi nos anos 1970 que as empresas começaram a usar o termo “responsabilidade social empresarial”. Em 1974, dois economistas dividiram o Nobel de Economia por discutirem o Estado de bem-estar social, ou Welfare State. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) foi constituído em 1972 e, ironicamente, foi também nessa década que o maior derramamento de petróleo já registrado até então ocorreu, em 1973, no México — logo na ressaca do crash do petróleo.
Nessa esteira, os anos 1980 foram muito marcados por crises financeiras mundiais. O alto endividamento dos países latino-americanos e a crise imobiliária japonesa reforçaram as dúvidas sobre a sustentabilidade do modelo econômico vigente. Em resposta a esses questionamentos que se iniciaram na década anterior, em 1990 foi lançado o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que ainda é utilizado como métrica de classificação de países: as noções de “países desenvolvidos” ou “países subdesenvolvidos” são reflexo do uso do IDH como método classificatório.
Em 1992, o termo “sustentabilidade” apareceu na ECO-92, primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, cujas discussões desencadearam a assinatura do Protocolo de Kyoto, em 1997. Nele, países comprometeram-se com a redução da emissão dos gases que produzem o efeito estufa.
O conceito do social return on investment (SROI) começou a circular no início do século. Trata-se de um método que compara os valores dos recursos investidos em um projeto ou programa e o valor social gerado para a sociedade. Também nesse período o B Lab criou o Global Impact Investing System (GIIRS), sistema que facilita a comparação de métricas do desempenho socioambiental de empresas privadas.
O conceito do triple bottom line, usado para explicar o de sustentabilidade, foi cunhado em 1994 por John Elkington. E, no início do século XXI, ganhou popularidade.
Já na segunda metade da década de 2000 e início de 2010, o conceito de “valor compartilhado”, criado por Porter e Kramer, passou a ser amplamente discutido. O termo refere-se à geração de valor econômico e social de uma atividade comercial. Olhando especificamente para questões ambientais, em 2016 houve o Acordo de Paris, quando as nações signatárias se comprometeram com metas voluntárias para a diminuição de emissão de gases estufa a partir de 2020.
De 2020 para cá, talvez a recapitulação histórica seja mais recente. São indiscutíveis as profundas marcas sociais, ambientais e políticas que a pandemia gerou. Vencer a doença foi um problema social em si, mas outros temas emergiram fortemente em todo o mundo, como a discussão sobre os formatos dos sistemas públicos de saúde. Frisou-se a importância da exploração de recursos de maneira sustentável e deu-se luz ao questionamento sobre como apoiar populações economicamente frágeis e vulneráveis às mudanças externas.
Para que não se confunda ESG com respostas instantâneas às grandes urgências do mundo pós-pandêmico, é importante apresentar dois conceitos: “moda” e “tendência”.
Moda é uma prática, atividade ou conceito incorporado de forma consciente em uma rotina diária.
Tendência envolve a mudança no gosto, no estilo de vida e em comportamentos. Cresce em função de drivers sociais, ambientais e psicológicos e afeta mais de uma indústria e mais de um segmento. Elas são direcionadas por necessidades e demandas de consumidores e têm impacto em mudanças futuras.
Aos poucos, a tendência passa a ser assumida como mentalidade emergente e dominante e transforma-se em Zeitgeist, que pode ser traduzido como “Espírito do tempo”. Usa-se essa expressão para denominar o conjunto do “clima intelectual e cultural” do mundo em determinado momento da história.
Pelo que foi visto até aqui, é possível afirmar que ESG é uma moda. O termo ESG é moda, mas essas práticas, que tomam conta do campo corporativo, das revistas de negócios e até mesmo das organizações sociais, vêm sendo construídas e pautadas por todo o campo há anos.
A construção histórica apresentada neste artigo mostra que as práticas de ESG não são uma moda, mas sim uma tendência de todo o último século. Anteriormente, ela já havia sido batizada com muitos outros nomes.
As organizações e atores que desenvolvem projetos em todo o campo socioambiental sempre pautaram a discussão sobre os direitos, minorias, importância de retardar os desastres ambientais e outros temas. Não só pautaram, mas sempre estiveram responsáveis por garantir que a sociedade não se esquecesse da relevância dessas temáticas e por buscar soluções para os problemas públicos.
Logo, no nascimento e na vida das organizações da sociedade civil, seus propósitos são “fazer ESG”. Organizações e pessoas que atuam com aquilo que é público foram quem construiu o tema de ESG que hoje é cotado pelo campo corporativo.
Pode ser chamado do que quiser: ESG, sustentabilidade, impacto socioambiental, responsabilidade social corporativa, responsabilidade ambiental, compliance ou qualquer outro termo (aqui, sim) da moda. O importante é que o conceito e as práticas relacionadas ao tema sejam incorporados no comportamento dos líderes gestores fundadores e acionistas das empresas — e, no longo prazo, quem sabe, por ser uma tendência, o termo mude consistentemente a lógica de exploração e abusos das organizações sobre os recursos naturais e as pessoas mais vulneráveis da sociedade.