Manual de Orientação Legal para Adequação do Terceiro Setor ao Novo Código Civil

Por: Marcos Biasioli
01 Setembro 2002 - 00h00
As entidades beneficentes estão deixando passar despercebido o novo regulamento ao qual estarão submissas a partir de janeiro de 2003, quando entrará em vigor o novo Código Civil1.

Três, certamente, são as razões do menosprezo: uma, ante o fato da longevidade do início da vigência da nova Lei, o que tornará compulsória sua aplicação. Duas, pela dedução de que as alterações legislativas apresentadas pelo novo Código apenas implicarão em uma adequação jurídica de seus estatutos. Três, prende-se ao fato da dedução de que o novo regulamento não lhes atingirá, pois apenas as novas instituições é que terão de se alinhavar ao novo diploma civil, frente ao entendimento do direito adquirido, ora intocável.

Enganam-se!

As alterações provocarão sérias influências na vida dos agentes do Terceiro Setor.

Vejamos:

Associações

Denominação

Razão social. Muitos organismos do Terceiro Setor batizaram sua obra, precedendo do vocábulo sociedade. Podemos destacar algumas delas de significante papel no desenvolvimento social: Sociedade Beneficente São Camilo, Sociedade Pestalozzi, Sociedade Civil Irmãs Santa Cruz, Sociedade Paraense de Cultura, Sociedade Bíblica do Brasil, Sociedade Beneficente Israelita e tantas outras.

O velho Código Civil não impõe nenhuma restrição a respeito, sendo endossado pela Lei de Registros Públicos2, que também não prevê impedimento. Entretanto, o novo Código Civil, de forma sutil e até imperceptível, introduziu no âmago do art. 533, combinado com o art. 9814, critérios claros para definir que uma associação está organizada para fins não econômicos, a contrário senso da sociedade, que deriva de finalidade econômica, com previsão de partilha de resultados, o que é vedado às associações5.

Nesse diapasão, todas as entidades que possuam em sua denominação social, a expressão sociedade, deverão proceder a alteração estatutária, para adequar-se à atual legislação.

A alteração implicará em investimento para a difusão da alteração de sua razão social, que certamente coincidirá com sua marca frente aos seus alunos, pacientes, fornecedores, bancos, papelaria de toda instituição, displays, fachadas, registros e tantos outros.

Associados

Inserção estatutária =

admissão/demissão – direitos/deveres. Pela legislação, tanto os critérios de ingresso e saída como os direitos e deveres dos associados ficavam à mercê do regimento interno da instituição. Entretanto o art. 54, II e III6, obriga as associações (exceto fundações) a imprimirem o regulamento no bojo de seu estatuto, sob pena de nulidade.

Essas inserções estatutárias acarretam, além de maior custo operacional, em um engessamento da gestão.

Exercício de direito. O art. 58 da Lei em estudo, também estabelece que: “nenhum associado poderá ser impedido de exercer direito ou função que lhe tenha sido legitimamente conferido, a não ser nos casos e pela forma previstos na lei ou no estatuto.” Não obstante, o fato de que as instituições, na prática, já possuírem regulamento a respeito, a lei fortaleceu a figura do associado, que também não poderá ser tolhido de seus direitos, unilateralmente.

Exclusão. Flagra-se também que o novo Código restringiu a exclusão do associado por critério unilateral da direção da entidade beneficente, haja visto a disposição do art. 577, que limitou tal exclusão a duas hipóteses: a) justa causa (com base no estatuto). b) motivos graves (na omissão do estatuto).

A ausência da previsão estatutária remeterá o julgamento à Assembléia Geral, que deverá deliberar a respeito da exclusão do associado, com a maioria absoluta dos presentes. E relevando que a convocação de uma assembléia é bastante onerosa, torna-se premente o resguardo estatutário.

Cessão de direitos. Outra inovação relacionada com os associados é aquela disposta no caput8 do art. 56, que veda a transmissão da qualidade de associado, exceto se houver permissão estatutária. Nesse caso, nem mesmo os sucessores naturais terão iguais direitos, salvo previsão no estatuto.

Participação patrimonial. A associação passou a ter feição de uma sociedade com fins econômicos, apesar de sua natureza não-econômica. Prelecionam o parágrafo único do art. 56, cumulado com o art. 61, a possibilidade de o associado ingressar com uma fração de capital na associação e, quando dela se despedir, levar consigo a importância investida, devidamente atualizada monetariamente.

Em outras palavras, participar de uma associação não só está relacionado com a prática desinteressada de uma atividade, mas também com a prática de um negócio, e muitas entidades não precavidas poderão vir a serem alvos de esvaziamento de seus ativos, caso haja malversação de alguns de seus associados.

O Código primitivo tratava do assunto em seu art. 22, porém, com uma leveza capaz de se suscitar a possibilidade de fracionar o patrimônio social ante à ausência de critérios claros, como os que foram gravados pelo novo Código.

De toda forma, prevalece o imperioso zelo sob aqueles que procuram na associação os interesses pessoais.

Separação de direitos/vantagens. A jovem Lei também facultou às associações, o direito de fragmentarem seu corpo social9 em categorias, outorgando-lhes a prerrogativa de atribuírem direitos iguais, mas vantagens distintas para os associados, que, em suma, deverão ser proporcionais às suas contribuições.

Sustentabilidade

As fontes de recursos para sua manutenção. Não obstante a Lei até então vigente não obrigar a inserção desse tópico no estatuto, na prática, já é comum a inclusão das fontes de recursos. Porém, aquelas instituições que ainda não contemplaram seus estatutos com tais registros estarão obrigadas a fazê-lo por conta do disposto no art. 54, IV10 do novo Código Civil.

O cumprimento da referida obrigação legal afastará a conotação de sociedade, pois as atividades econômicas eventualmente praticadas pelas entidades sociais serão meio, e não fim. Os frutos serão destinados aos seus próprios propósitos não econômicos, o que afasta, por si só, a possibilidade de serem cerceadas suas atividades econômicas, sob o argumento da vedação imposta pelo art. 53, combinado com o art. 62, da dita Lei.

Gestão

Modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos. O legislador no caso em questão determinou de forma compulsória a inserção no estatuto social, pelo art. 54, V, o modelo de administração da entidade, por intermédio de seus órgãos colegiados.

Assembléia Geral

Com a vigência do novo Código11, não só foi regulamentada a figura da Assembléia Geral, como também sua privativa função, que será: a) Eleger administradores. b) Destituir administradores. c) Aprovar contas. d) Alterar o estatuto.

Além das funções da Assembléia Geral, também foi instituído um quorum necessário para deliberações válidas, que é de dois terços dos presentes, podendo deliberar apenas com a maioria absoluta dos associados, ou com menos de um terço nas convocações seguintes.

A promoção da Assembléia também foi regulada, ficando garantido a um quinto dos associados tal direito.

Fundações

Vocação

Vocação das fundações. Nesse particular, credita-se a maior heresia do legislador, eis que limitou como vocação fundacional, apenas quatro segmentos: a) Religião. b) Moral. c) Cultura. d) Assistência. Esqueceu-se de outras vocações de relevante valor social, tais como aquelas de pesquisa e meio ambiente.

É certo que a tentativa em albergar todas sob o manto de assistência, que possuirá uma conotação ampla, será uma prática habitual. Contudo, certamente enfrentar-se-á resistência com os agentes do registro público.

Os Bens

Domínio do bem. Em sendo instituída a fundação por agente vivo, por meio de seus bens, o instituidor ficará obrigado a transferir a propriedade que for doada para atender aos fins da obra por ele idealizada para a fundação, sob pena do Judiciário fazê-lo.

Intervenção do Ministério Público

Poderes. Foram estendidos os poderes do Ministério Público no velamento das fundações, como bem percebe-se no parágrafo único, do art. 65 que outorgou a ele o direito de elaborar o estatuto da fundação após 180 dias do prazo assinado pelo instituidor.

Direito da Minoria

Estatuto. A ausência de unanimidade na votação da alteração estatutária da fundação, facultará à minoria impugná-la, desde que o faça no prazo máximo de dez dias. A dedução é que a minoria ficou fortalecida com a nova Lei, o que resulta na seleta admissão de todos os associados, evitando o trauma do embate que muitas vezes é até responsável pela ingovernabilidade da fundação.

Obrigação de Todas
Entidades do Terceiro Setor

As alterações edificadas pelo novo Código Civil, certamente, provocarão muitas mudanças na vida de todas entidades sociais, e não somente nas novas que estarão sendo constituídas após a vigência da Lei.

A conclusão não é singular e tampouco teórica ou doutrinária, mas está na própria Lei, que assim aduz: “art. 2.031. As associações, sociedades e fundações, constituídas na forma das leis anteriores, terão o prazo de 1 (um) ano para se adaptarem às disposições deste Código, a partir de sua vigência; igual prazo é concedido aos empresários”.

No tocante às fundações instituídas com finalidades diversas daquelas previstas no atual Código12 (religiosos, morais, culturais ou de assistência), serão toleradas pelo legislador, porém, estarão subordinadas ao funcionamento nos moldes da nova Lei13.

Dessa forma, as entidades que até janeiro de 2004 resistirem à Lei poderão amargar a nulidade de seus atos e, até mesmo, provocar a responsabilização de seus administradores.

Assim sendo, o ceticismo quanto aos efeitos da Lei, por conta das incontáveis emendas que vêm sofrendo pelo próprio Legislativo, assomado da certeza do direito adquirido, por si só, não serão suficientes para golpear as exigências conferidas na nova norma.

Um bom conselho é que os organismos do Terceiro Setor procurem rapidamente se afeiçoar com a Lei 10.406/02 (novo Código Civil), evitando que o trauma seja menor com a precaução, do que a nulidade sem solução.

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