Terceiro Setor Conectado

Por: Amanda Riesemberg
06 Dezembro 2016 - 19h02

O futuro está na rede

Não se sabe ao certo a quantidade de organizações do Terceiro Setor no país, quem dirá quantas delas estão conectadas à rede mundial de computadores. Sei, mais de modo empírico do que por argumentos factuais, que muitas delas ainda se envolvem com seus stakeholders de duas únicas maneiras: por meio de doação de dinheiro ou por meio de doação de tempo. O problema é que, com isso, acabam perdendo um potencial enorme que está ali nas redes, à espera deste potencial ser ativado.

Há diversas formas para essas organizações se transformarem em organizações conectadas: ter seu próprio site, escrever conteúdo de formação em sites parceiros (como o portal Nossa Causa), organizar um evento on-line, ativar suas redes sociais, fazer campanhas de crowdfunding (doações mediante financiamento coletivo), entre muitas outras.

Os tempos atuais permitem que, pela internet, as pessoas se envolvam com causas sociais de múltiplas maneiras. Desde o incentivador da organização, que apenas interage com posts nas redes sociais, até os que se sensibilizam, tornando-se doadores, colaborando com pequenas quantias mensais em plataformas de crowdfunding, são várias as categorias de apoiadores que a vida on-line possibilita criar.

Para que o Terceiro Setor faça parte da world wide web, independentemente do canal utilizado, é preciso estar aberto a um novo jeito de se comunicar. O processo de comunicação on-line é pouco ou quase nada diferente do off-line: é necessário planejar, executar e analisar.

Algumas dicas de etiqueta social ajudarão a aproveitar melhor o que a internet pode oferecer em relação à comunicação tradicional. Mas, antes de tudo, e para qualquer processo de comunicação,faz-se imprescindível olhar para a organização e se perguntar: nós estamos preparados?

Quando eu digo para olhar para a organização, refiro-me a se desafiar a compreender como tais entidades se enxergam e se elas estão de acordo com essa imagem. Pense em sua organização como uma pessoa. Sua organização é quem gostaria de ser? As pessoas a enxergam como de fato deveriam? Ela tem propriedade no que diz e para quem diz? Você é capaz de me convencer a doar para sua organização em apenas um minuto de fala? Tem quem faça isso. E isto é dominar a retórica: a arte de argumentar, de empregar bem as palavras, de ser assertivo. Trago, então, uma das questões mais importantes para uma boa e inesquecível presença digital: a comunicação assertiva.

Assertividade

A assertividade na comunicação economizará seu tempo e seu dinheiro. Quando você sabe o que comunica, para quem comunica e como o faz, o resultado de suas ações tem muito mais impacto no seu trabalho. Se você decidir se transformar em uma organização conectada, trabalhe para gerar resultados diretos pela sua causa, e não apenas para ter algumas centenas de curtidores no Facebook. Ter pessoas engajadas em seu projeto é mais importante do que ter seguidores.

Para gerar resultados factíveis para sua causa, é preciso entender, primeiramente, que ser uma organização conectada não é apenas estar presente na maior rede social existente. As redes sociais são apenas parte da estratégia digital, do plano de comunicação e marketing da organização. Elas funcionam como suporte para outros canais de comunicação. Estar conectado significa que você abre canais extras de contato, nos quais você deixa de ser interlocutor e se torna ouvinte. São os usuários que têm o poder de fala na rede, e não as organizações, marcas ou empresas.

Conectar-se é estar vulnerável. Você abre espaço para críticas positivas e negativas, além de ter a oportunidade de defender a sua causa e receber feedbacksobre as suas ações.

Os Desafios Das Organizações No Mundo Digital

 

Levar a organização ao ambiente on-line exige energia. Caso você não tenha energia sobrando, é hora de reavaliar em quais áreas você a tem esbanjado e como reorganizar seus recursos para investir nas redes. Investimento é um dos maiores desafios que as organizações enfrentam.

Recursos

Sim, é preciso investir em comunicação on-line de qualidade. Estar presente nas redes sociais exige dedicação. Se o tempo está escasso, demande a tarefa para um profissional. Se o dinheiro está escasso, demande-a para um voluntário.

Profissionalismo

Ter presença digital não é tarefa para qualquer um. Embora estar presente nos meios digitais seja algo acessível a todos, é preciso saber como fazê-lo – afinal, não basta apenas ter um perfil em uma rede social, é preciso saber como utilizá-lo adequadamente. Se você não sabe nem tem condições de pedir auxílio a um profissional ou voluntário, busque cursos e ferramentas que o ajudem a utilizar as redes de maneira mais inteligente e eficiente.

Fazer mais, fazer mal

Não faça mais, faça melhor. Não é preciso estar em todas as redes, postando diversas vezes ao dia. Seja econômico. Se você não tem muita agilidade na geração de conteúdo, não bombardeie a sua linha do tempo de uma vez só porque você separou um tempo para isso. Agende os posts e publique-os moderadamente. As informações devem ser transmitidas no tempo certo, na hora certa, para alcançar o público.

Trabalho em rede

O conceito de ecossistema pode ser novo para as Organizações da Sociedade Civil (OSCs), mas tem sido muito difundido no meio empreendedor. Define-se pelo trabalho colaborativo de fortalecimento de redes e parcerias, que oferece condições para a coevolução com outras organizações. Talvez um dos maiores paradigmas a ser derrubado no Terceiro Setor seja o da não competitividade e da luta conjunta em prol da causa.

Alcance mais mobilizadores

A internet e as redes sociais têm efeito viral. Uma vez que o conteúdo é postado, fica difícil saber o quanto ele alcançou. Positivo ou negativo, esse é o maior poder do mundo digital. Não há barreiras. Você pode alcançar seu público onde quer que ele esteja e de diferentes formas. Até mesmo recursos para pessoas com deficiência visual e auditiva já estão disponíveis para uma comunicação ainda mais inclusiva. Esteja de braços abertos para receber novos apoiadores.

Ativismo digital

Engana-se quem diz que o ciberativismo é para preguiçosos. Recentes manifestações virtuais já provaram que o poder das redes gera reais transformações sociais. Valorize os manifestantes digitais da sua rede, pois essa também é uma forma de advogar pela causa.

Disponibilidade

Quem trabalha por uma causa sabe que o tempo é precioso e que não dá para perdê-lo à toa. Estar disponível para responder o seu público em tempo real não é perder tempo, é se comportar como uma organização conectada, é se relacionar com um potencial apoiador, é construir diariamente laços de confiança com o seu próximo colaborador. Invista nesse relacionamento.

Controle

Nem sempre será possível manter o controle. Quando esse momento chegar, não aja por impulso. Reúna sua equipe e decida que atitude vocês tomarão. Certa ou errada, ela terá de ser seguida até o fim e você saberá gerir as críticas relacionadas a ela.

Transparência

Passado, presente e futuro. Tudo pode ser trazido à tona quando você faz parte de um canal público e de tamanha audiência. Não esconda nada. Não finja que algo não aconteceu. Estar nas redes é ser capaz de gerir críticas sobre o seu passado no presente e ter inteligência para evitá-las no futuro. Estabeleça uma posição a ser tomada perante comentários críticos sobre sua organização.

Cultura social

A questão a ser dialogada entre os líderes da organização não é mais se devem fazer parte das redes sociais, mas como estar presentes nelas de forma eficiente.

Há ainda uma crise de liderança a ser enfrentada pelas OSCs. Sem propósito compartilhado, os líderes das organizações perdem-se no ego da identificação pessoal da causa e sofrem com a inovação proposta pelas redes e pelo agir diferente em busca da missão social, que é maior que sua missão pessoal. As estruturas hierárquicas padrão não permitem que novas ideias sejam aprovadas com facilidade e complicam a adesão aos novos canais de comunicação.

Uma vez compreendidas e alinhadas as lideranças, surge ainda outra problemática: a falta de confiança na equipe. Essa é uma questão de extrema importância. Se sua equipe não tiver autonomia para falar da sua organização sem a necessidade de autorização prévia, é preciso rever o seu modelo de comunicação. Para ajudar as lideranças nessa descentralização, sugiro a criação de uma política interna de uso das redes sociais, tanto como medida para uso controlado das redes pessoais como para direcionamentos do que pode e de como deve ser o uso das redes institucionais.

A comunicação, on-line e off-line, precisa estar unificada. O que se fala nas redes deve ser de conhecimento de todos, e o que se fala na organização deve ser traduzido para o ambiente externo e virtual. O como e o que falar precisam estar claros para todos da equipe, principalmente para quem é o ponto de contato nas redes sociais e fora delas.

As redes sociais são orgânicas. Elas suplicam autenticidade, tempo real e dinamismo. É preciso frequência e presença de impacto. Mas é claro que, para compreender isso, os líderes também devem fazer parte da rede. O ambiente on-line não está disponível só para o público externo, mas para o interno também. Isso significa que criar grupos internos nas redes não só facilita a comunicação como faz parte de uma cultura social.

A seguir, confira um checklist para que você possa dar início à presença da sua organização nas redes sociais:

  • Desenvolva uma política de uso das redes sociais.
  • Estabeleça um time de responsáveis pelas tarefas.
  • Crie um processo.
  • Defina o propósito de uso.
  • Faça um cronograma de postagens.
  • Tenha uma linha editorial e uma identidade visual.
  • Otimize o trabalho com ferramentas de edição de imagens e agendamento.

 

 

 

 

Não tem todos os itens indicados? Experimente começar. Sabe aquela história de montar o paraquedas depois de ter pulado do avião? Funciona também, contanto que você abra o paraquedas antes de cair no chão.

Redes Sociais São Para Relacionamentos

Não existe uma regra universal, mas boas práticas aumentam o potencial da rede em prol da sua organização. E uma dica valiosa que posso deixar é: use as redes sociais para construir um capital social. Construir um capital social é gerar relacionamentos significativos, nos quais se compartilham reconhecimento e reciprocidade. As redes sociais se tratam de cultivar influenciadores, transformar seguidores em fiéis.

Para gerar relacionamento é preciso interagir. Não seja indiferente, não permita que os elos se afrouxem. Converse com o público, engaje-o. Seja atencioso. Enfrente as crises, não desista. Dialogue, não discuta. Ouça o que as pessoas têm a dizer. Se precisar parar e olhar para dentro para tentar resolver uma questão pontuada por um usuário, pare e pense. Você não precisa estar disponível 24 horas por dia, mas esteja aberto para receber e ouvir.

Busque referências, tenha referência, seja referência. Sustentar o relacionamento on-line é diferente de manter aquela amizade da vida real. Criatividade, gentileza e agilidade são fatores decisivos para fortalecer sua comunidade. A sua comunidade não é formada só por pessoas físicas, mas também por outras organizações que apreciam o seu conteúdo e dele se valem para desenvolver trabalhos. Reconheça todas as formas de interação.

Família, amigos, parceiros, voluntários, doadores, beneficiários. É possível se comunicar com todos eles de uma única vez em um único lugar, porém, seja claro. Quem está do outro lado recebendo sua mensagem não consegue reconhecer o seu tom de voz e tende a interpretar de acordo com o seu próprio contexto.

Lembre-se: uma organização conectada deve comportar-se como uma organização conectada. Prepare-se e mãos à obra.

 

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