Por Amanda Maciel.
Feminicídio é o assassinato de uma mulher pelo simples fato de ela ser mulher — e esse crime continua avançando no Brasil. Em 2025, o país já ultrapassa a marca de mil registros, segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Em 2024, as tentativas de feminicídio cresceram 26%, e, apenas entre janeiro e setembro de 2025, mais de 2,7 mil mulheres sofreram tentativas de morte, enquanto 1.075 foram assassinadas, evidenciando a gravidade e a persistência da violência de gênero no país.
A Lei Maria da Penha, em vigor desde 2006, e a tipificação do feminicídio como crime hediondo, em 2015, formam hoje a espinha dorsal do arcabouço legal de proteção às mulheres. Mas, na prática, não têm sido suficientes para conter os números.
Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que, entre 2015 e 2023, mais de 10,6 mil brasileiras foram vítimas de feminicídio. O Anuário de 2024 indica que, enquanto as mortes violentas intencionais caíram 5,4% no país, os feminicídios seguiram tendência oposta, crescendo e atingindo o maior patamar da série histórica.
A maioria dos crimes ocorre dentro de casa e é cometida por parceiros ou ex-parceiros, o que reforça o caráter estrutural da violência de gênero. Em 2024, 65% dos estupros foram registrados dentro do domicílio, e quase metade dos agressores eram familiares.
Diante de políticas públicas ainda insuficientes, organizações da sociedade civil têm desempenhado papel central na proteção das mulheres e na pressão por mudanças. Especialistas ouvidos pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) destacam que movimentos feministas, ONGs e coletivos foram determinantes para denunciar violações, acolher vítimas e influenciar leis e políticas de enfrentamento às violências contra as mulheres.
Na prática, essas organizações atuam em três frentes principais:
Atendimento direto às vítimas – acolhimento, abrigo, apoio psicológico e orientação jurídica;
Incidência política – pressão por orçamento, fiscalização da aplicação das leis e participação em conselhos e fóruns;
Formação e comunicação – campanhas educativas, produção de dados e ações de conscientização nas comunidades, escolas e redes sociais.
Em Mogi das Cruzes (SP), a ONG Recomeçar – Associação de Assistência às Mulheres, Crianças e Adolescentes Vítimas de Violência oferece acolhimento institucional sigiloso para mulheres em risco iminente de morte, com ou sem filhos. Ligada à rede de Proteção Social Especial de Alta Complexidade do SUAS, a organização também promove cursos e rodas de diálogo para fortalecer a autonomia e a informação das mulheres atendidas.
Já o Instituto Filhas de Sara oferece atendimento psicossocial, assistência jurídica, grupos de apoio e convivência para mulheres em situação de violência doméstica, além de orientar sobre canais de denúncia como o 180 e o 190.
Outras iniciativas, como a Casa da Mulher Brasileira em diferentes capitais, integram num mesmo espaço apoio psicológico, jurídico e social, abrigando serviços especializados e articulando a rede de atendimento com a segurança pública e o sistema de justiça.
Organizações feministas também se consolidaram como linha de frente no enfrentamento à violência de gênero. O Instituto Maria da Penha atua para garantir a aplicação integral da Lei que leva o nome de sua fundadora e desenvolve projetos de formação, campanhas de conscientização e incidência em políticas públicas.
Estudo da Universidade de Brasília mostrou como oito ONGs feministas espalhadas pelo país assumiram funções que deveriam ser do Estado durante a pandemia de Covid-19: elas organizaram acolhimento, orientação jurídica, apoio psicossocial remoto, formação de servidores públicos e até distribuição de alimentos para mulheres em situação de violência, num contexto de isolamento e retração dos serviços públicos.
Iniciativas como Tamo Juntas, Instituto Noos Por Elas, Associação Artemis e Associação Fênix combinam atendimento direto às vítimas, ações educativas e pressão política para o cumprimento das leis e a responsabilização dos agressores.
Com a digitalização da vida cotidiana, surgiram também projetos que se articulam principalmente pela internet. É o caso do Projeto Justiceiras, uma força-tarefa formada por advogadas, psicólogas, assistentes sociais, médicas e voluntárias de todo o país, que oferece atendimento on-line gratuito a mulheres em situação de violência.
Pela plataforma, as vítimas recebem orientação jurídica, apoio emocional e encaminhamento para a rede local de serviços, muitas vezes antes mesmo de registrarem boletim de ocorrência. A estratégia responde a um problema apontado por estudos recentes: em muitos territórios, a internet se tornou o primeiro canal de desabafo e busca de ajuda, mas também um espaço de riscos e insegurança digital.
A rede de enfrentamento à violência contra as mulheres no Brasil é composta por diferentes serviços – da saúde à assistência social, passando por delegacias, juizados e centros de referência. A atuação articulada entre poder público e sociedade civil é um dos pilares da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, que define quatro eixos: prevenção, combate, assistência e garantia de direitos.
Na ponta, porém, quem ajuda a costurar essa rede e a torná-la real para mulheres em situação de risco são, muitas vezes, as organizações comunitárias, coletivos de bairro, grupos de mulheres negras, indígenas, periféricas, LBTQIA+ e rurais. Elas denunciam, acompanham, traduzem a linguagem jurídica, organizam vaquinhas para aluguel e alimentação, e pressionam para que os serviços funcionem onde o Estado ainda não chega de forma efetiva.
Os recordes de feminicídios e estupros mostram que a resposta institucional ainda é insuficiente. Especialistas defendem investimentos contínuos em prevenção, com educação para igualdade de gênero, no fortalecimento das redes locais de atendimento, no apoio estável às organizações da sociedade civil, que sustentam parte essencial da proteção e em políticas específicas para mulheres negras, periféricas, indígenas, quilombolas, com deficiência e LBTQIA+, que são as mais afetadas pela violência.
Enquanto isso não acontece, o Brasil continua somando estatísticas que têm nome, rosto e história e são, em grande medida, evitáveis. Entre leis ainda pouco implementadas e serviços que falham, são as organizações da sociedade civil e as redes de mulheres que insistem, todos os dias, em transformar luto em luta e construir, na prática, caminhos para que nenhuma mulher tenha como destino o feminicídio.
(Redação ONG News)
Esse conteúdo foi originalmente publicado por OngNews, em 10 de Dezembro de 2025.
Imagine como seria maravilhoso acessar uma infinidade de informações e capacitações - SUPER ATUALIZADAS - com TUDO - eu disse TUDO! - o que você precisa saber para melhorar a gestão da sua ONG?
Imaginou? Então... esse cenário já é realidade na Rede Filantropia. Aqui você encontra materiais sobre:
(certificações, prestação de contas, atendimento às normas contábeis, dentre outros)
(remuneração de dirigentes, imunidade tributária, revisão estatutária, dentre outros)
(principais fontes, ferramentas possíveis, geração de renda própria, dentre outros)
(Gestão de voluntários, programas de voluntariado empresarial, dentre outros)
(Softwares de gestão, CRM, armazenamento em nuvem, captação de recursos via internet, redes sociais, dentre outros)
(Legislação trabalhista, formas de contratação em ONGs etc.)
Isso tudo fica disponível pra você nos seguintes formatos:
Saiba mais e faça parte da principal rede do Terceiro Setor do Brasil:




































