Para Que Serve a Multidão?

Por: Aurimar Pacheco Ferreira
22 Fevereiro 2018 - 00h00

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Levanto ao amanhecer, trato de me engravatar e me direciono ao metrô. Lá vou eu, rumo a mais um dia árduo de papéis, telefonemas e pessoas que estou cansado de ver. Ah, minha São Paulo! Terra da garoa, cidade cinza, que comporta tantos prédios colossais; cidade na qual sequer consigo decidir se é realmente onde desejo estar.

Caminho a passos largos entre a multidão; em meio aos esbarrões, sons de sapatos e vozes sonolentas, escuto o soar do toque de recolher do metrô e, com rapidez, consigo entrar no vagão. Ufa! Talvez seja o meu dia de sorte.

Lembro-me de ter escutado em alguma aula do ensino fundamental que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço, mas devo admitir que, todos os dias, me pergunto se isso é mesmo verdade. Está tão abafado que mal consigo respirar, mas olho em volta e percebo que todos aqueles ao redor compartilham da minha sensação de asfixia.

Apesar dessa conexão de sentidos, reparo que dificilmente reconheço alguém por ali. Talvez eu esteja exausto demais para notar um rosto familiar, e mesmo recebendo alguns sorrisos, não creio que seja possível que alguém se recorde de mim.

Começo a observar aqueles que me rodeiam e sinto que posso enxergar através de suas feições. Em poucos minutos, faço as minhas breves interpretações daqueles que aparentam ser mais intrigantes.

Com dificuldades, verifico o fundo do vagão e vejo um homem negro e muito alto. Seu olhar de desconfiança e desconforto e suas mochilas aparentemente pesadas me fazem crer que ele não seja daqui, e muito provavelmente que não seja deste país. Fico imaginando qual é a sua história. O que ele busca? De onde vem? O que deixou para trás? E já estava prestes a cultivar uma boa aventura; mas, durante o meu devaneio, fui interrompido por um empurrão. Uma mulher vinda da Linha Vermelha entra junto com uma avalanche de outros corpos; branca, com ar de arrogância, esconde-se atrás de seus óculos escuros. Com toda a sua inquietude, deduzo que não poderei decifrá-la, mas sou capaz de notar o quanto está nervosa; aliás, todos conseguem. Não poderia culpá-la; talvez seja apenas um dia ruim.

A máquina retoma sua movimentação.

Volto a olhar para os lados, até que um casal me chama atenção: um rapaz alto e uma menina com fones de ouvidos; ambos negros, cabelos volumosos e escuros. O garoto possui ombros largos; ela, lábios pintados de vermelho. As olheiras dele denunciam sua dificuldade para dormir; ela, pelo contrário, não as tem, mas ainda assim é possível perceber seu cansaço. Entre carícias e olhares maliciosos, seus sorrisos apaixonados não são abalados por toda a efervescência dessa cidade.

Permanecendo nessa esfera de empatia, testemunho algo estranho aos meus olhos acostumados ao pessimismo. Ao meu lado esquerdo, uma jovem com o rosto pálido, olhos fundos e mãos tremulas, que se mantém de pé com muita dificuldade. Entre uma estação e outra a velocidade é diminuída até que tudo para, e a garota quase vai ao chão. Imediatamente, uma pessoa se levanta a fim de oferecer ajuda. Uma mulher, aparentando cinquenta anos, estatura baixa, pele morena, cabelos curtos e cheios de pequenos cachos, portadora de um sorriso frouxo e com ar de preocupação, permite que a moça sente-se e descanse.

Quando assisto a atos de ternura percebo que dentro de São Paulo, e em qualquer outro lugar, é possível achar um feixe de luz dentre as nuvens de negatividade. Em diversos momentos respiro mais tranquilo, assim como aquela garota. Infelizmente, talvez eu tenha sido o único a notar coisas tão belas, fazendo com que eu volte a pensar nas minhas concepções mais melancólicas.

Schopenhauer ressaltava o sofrimento como essência da vida, e quando penso nesse conceito, tenho dificuldades de não confirmá-lo. Em cerca de quarenta minutos, a partir do momento em que entro em contato com tantas pessoas ao mesmo tempo, elas exalam suas frustrações, tristezas e anseios.

Nós somos seres incompletos, saímos de nossas casas todos os dias em busca do aprimoramento de nossas vidas; queremos a melhora e não medimos o custo. Muitas vezes estamos tão cegos com esses objetivos, que assistimos nossas vidas correrem diante de nós. A rotina amarga exercida com esforço indescritível nos impossibilita de apreciar as belezas que se escondem por trás dos edifícios da cidade.

Em determinados momentos, quando observo o egoísmo prevalecendo, sinto uma ponta de infelicidade. Porém, quando era mais jovem, tudo se tornava mais intenso; tinha uma postura revolucionária, imaginava-me corroendo toda a injustiça do mundo. A desigualdade econômica seria extinta, todas as necessidades básicas seriam supridas, o mundo transbordaria de respeito e tolerância; ou, ao menos, acreditei que poderia escapar do cotidiano e do grande vórtice de banalidades que suga todos que estão aqui. Há muito tempo compreendi a impossibilidade de ir contra uma corrente tão intensa e, para ser sincero, admito meu apreço por todas as diversas possibilidades e excitações que a vida pode proporcionar.

Afinal de contas, uma coisa tão simples, como conseguir um lugar para se sentar na volta do trabalho, tem uma carga de prazer gigantesca. Quem sabe tanta angústia não sirva para nos causar ansiedade, mas também para nos ensinar a valorizar detalhes que nos causam alívio.

Agora faltam apenas três estações; permaneço em pé desde a entrada no vagão, meu corpo se cansa logo pela manhã. Ao sair daqui andarei mais alguns quarteirões, como faço todo dia. Seria um alívio trabalhar em casa, porque a jornada que todos aqui percorrem é, com certeza, um grande desperdício de tempo. Não sei se eles também já caíram dentro desta imensidão de pensamentos. Espero que não.

Bem... Já não sei se isso é bom ou ruim.

Essa ambiguidade de pensamentos me sufoca, mas a dúvida própria do ser humano nos dá tantas incertezas, que se apreciadas da maneira correta, nos enchem de emoções fervorosas. E lá se foi a minha viagem; o maquinista avisa que estou próximo do desembarque. Ficar aqui não é tão atrativo, mas gostaria que essa transição de estações fosse mais devagar; chegar ao trabalho me parece ainda pior.

Escuto uma voz doce perguntar "Que horas são?". Essa maldita preocupação com atrasos é tão nociva... Por que é que temos tanto cuidado com isso? Tiro o celular do bolso para verificar, olho as horas e respondo sem aflições. Ela agradece e parece contente com a resposta. A porta se abre e me direciono ao meu objetivo, agora um pouco mais feliz, afinal, descobri mais um detalhe satisfatório. Adivinhem só?

É sexta-feira!

 

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