O cenário das organizações sociais no Brasil tem se tornado cada vez mais abrangente, tanto em termos geográficos quanto em relação às áreas de trabalho. Segundo a mais recente edição da pesquisa Fundações Privadas e Associações Sem Fins Lucrativos no Brasil (Fasfil), realizada em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), havia no Brasil 556,8 mil entidades sem fins lucrativos, das quais 290,7 mil eram fundações privadas e associações sem fins lucrativos. Nelas, estavam registradas como trabalhadoras assalariadas 2,1 milhões de pessoas, representando 23,0% do total dos empregados na administração pública naquele período, e 73,5% do total do emprego formal no universo total de entidades sem fins lucrativos (556,8 mil).
Para avaliar este cenário e o impacto da gestão profissional nas organizações, o Instituto Filantropia realizou uma pesquisa com mais de 30 mil pessoas e os resultados demonstraram que o investimento em capacitação, de fato, afeta a atuação das organizações. Confira mais detalhes!
O trabalho realizado por essas instituições impacta diretamente os indicadores de desenvolvimento no País, pois suas ações, muitas vezes postas em prática por meio de parcerias com governo e iniciativa privada, ajudam a alterar as realidades dos locais de atuação.
Em países desenvolvidos, o trabalho já está consolidado e sua gestão é similar àquela realizada por empresas idôneas do Segundo Setor, que visam à eficiência das ações, porém com o lucro das atividades sendo revertido em investimentos para a própria causa. O impacto do Terceiro Setor na economia norte-americana é grande: em 2009 havia mais de 1,9 milhão de organizações naquele país, contabilizando 70 milhões de trabalhadores remunerados e voluntários. A mão de obra empregada e remunerada nesse segmento (13,5 milhões de pessoas) fica atrás somente do varejo e da indústria. Contundo, no Brasil, assim como em outros países em desenvolvimento, esse caminho ainda está sendo trilhado e a percepção das instituições quanto às necessidades de capacitação de seus profissionais e voluntários já se torna mais evidente.
Em fevereiro de 2015, o Instituto Filantropia fez uma pesquisa quantitativa*, composta por 14 perguntas de múltipla escolha e duas perguntas abertas, enviada por comunicação eletrônica a uma base de 36.380 pessoas envolvidas com organizações do Terceiro Setor no Brasil nas áreas de educação, assistência social, meio ambiente, saúde, gestão, direitos humanos, arte e cultura, criança e adolescente, e outros. Todas as pessoas faziam parte do mailing do IF, atualizado periodicamente.
Pesquisa Quantitativa (16 Questões)
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Das 223 respostas recebidas, 44,4% indicaram atuar na área da assistência social; 35,0%, em educação; 28,7%, na área da criança e da adolescente; 22,4%, no campo da saúde; 17,5% eram do campo da arte e cultura; 14,3%, do meio ambiente; 12,1%, de direitos humanos; e 9,4% trabalhavam com gestão1. Além disso, a maior parte das instituições respondentes está consolidada, com mais de 10 anos de atividade: 26,5% funcionam entre 11 e 20 anos, e 36,8%, há mais de 20 anos. Somente 3,1% existem há menos de um ano.
Ainda no universo total dos respondentes, 60,6% têm até 20 funcionários registrados; 14,3%, de 20 a 50 funcionários; 8,1%, de 50 a 100 funcionários; 12,1%, de 100 a 500 funcionários; e 5,4% têm mais de 500 funcionários.
Paralelamente, foi realizada uma segunda pesquisa, de caráter qualitativo, com apenas uma questão dissertativa, enviada por meio eletrônico a 131 profissionais nas diferentes áreas da gestão (professores e palestrantes especializados em captação de recursos, legislação, gestão, comunicação, voluntariado, auditoria, tecnologia, contabilidade, assessoramento e sustentabilidade). Destes, foram obtidas respostas de 35 profissionais.
Pesquisa Qualitativa (1 Questão)
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O que você acha – e qual é o grau de importância – de gestores sociais investirem em capacitação para suas equipes? |
Neste ano de 2015, o Brasil tem passado por uma forte crise econômica, fato que impacta diretamente na atuação das organizações privadas com e sem fins lucrativos. Segundo dados da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e revisados em março, há um aumento significativo do risco da contração do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015. Da mesma forma, a elevação dos impostos e das tarifas públicas afetará a renda disponível, prejudicando a confiança de empresários e de consumidores devido ao ambiente de incertezas. A isso, soma-se ainda a crescente necessidade percebida pelas organizações do Terceiro Setor de contar com profissionais engajados, proativos e capacitados para enfrentar este cenário.
Acredita-se que o investimento em capacitação especializada gera processos de trabalho mais bem estruturados e melhora os resultados das organizações (impacto social, retorno financeiro para reinvestimento em projetos, melhoria no processo de gestão). Segundo dados da Fasfil 2010, das 2,1 milhões de trabalhadores registrados no Terceiro Setor, apenas 33% possuíam nível superior, sendo esta participação relativamente constante em todas as regiões do País, variando de 30,7%, no Norte, a 34,2%, no Sul.
Os profissionais do Terceiro Setor consultados na pesquisa qualitativa do IF fizeram colocações que demonstram a importância da capacitação para a atividade das instituições. Todas as respostas recebidas exaltaram a importância da capacitação de equipes e de voluntários para a realização de um trabalho mais eficiente nas organizações sem fins lucrativos. Algumas das respostas foram:
No Gráfico 2, apresentado a seguir, os entrevistados da pesquisa quantitativa corroboraram as observações feitas pelos participantes da pesquisa qualitativa: a maioria das respostas apontou para o planejamento no investimento de capacitação para os próximos três anos (17,0%) ou destacou investimentos já existentes (66,4%). Apenas 7,6% das instituições afirmaram não terem feito investimentos em capacitação e/ou não pretenderem investir nos próximos três anos.
Em relação à frequência desses investimentos, foi observado que mais da metade das organizações sem fins lucrativos (56,5%) investe entre uma e quatro vezes ao ano em capacitações para sua equipe. Contudo, 23,8% não fazem esse tipo de investimento.
Em relação ao valor destinado a esse fim, o valor médio anual em capacitações foi de até R$ 5.000 na maioria das instituições. O Gráfico 3 apresenta os detalhes de investimento das 223 instituições participantes.
Entre as organizações que investem pelo menos R$ 5.000 por ano em capacitações, 85% perceberam os impactos positivos dessa ação. Além disso, demonstrou-se que após realizarem esses investimentos, 52,9% das organizações observaram melhorias na captação de recursos e de novos parceiros, e 10,8% notaram significativa melhora em sua atuação. Considerando o universo total dos entrevistados (223), 78,9% observaram evolução no desempenho de sua equipe.
Outro ponto importante abordado no identificou que professores e educadores são os profissionais que mais recebem capacitação, bem como os gestores e os profissionais da área de recursos humanos (ambos com 35,4%), seguidos por captadores de recursos (30,5%) e assistentes sociais (26,9%). Já os que menos recebem capacitação são os contadores e advogados (6,7% cada).
Quando perguntados sobre o impacto de suas ações na sociedade, percebeu-se que apenas 5,8% considerou seu trabalho bem focado, atingindo 100% dos objetivos. A maioria dos entrevistados (45,3%), no entanto, analisou que o impacto é grande, porém ainda há muito a crescer. Da mesma forma, 29,6% apontaram ter obtido relativo impacto na causa, mas ainda muito abaixo do planejado. Os mais pessimistas (19,3%) consideraram que o impacto na sociedade foi pequeno, fato que demonstrou que as organizações já percebem a necessidade de capacitar-se para atingir mais adequadamente suas metas.
Após o investimento em capacitação, 52,9% das ONGs consideraram que os resultados em termos de captação de recursos e de parceiros melhoraram um pouco, enquanto outros 10,8% consideraram que evoluíram muito, ou seja, mais da metade dos respondentes vislumbrou na capacitação uma ferramenta de melhoria na área de captação de recursos.
Ao fazer um recorte comparando o grupo de organizações que investem em capacitação para seus funcionários e/ou voluntários (Grupo A) e o grupo de organizações que não investem neste fim (Grupo B), notou-se que o Grupo A tem percepção de impacto social positivo bem maior (62,2%) do que o Grupo B (19,3%), conforme demonstrado na Tabela 1. Ao mesmo tempo, o Grupo B representa o maior número de respostas com impacto negativo – isto é, acreditam que sua instituição tem baixo ou nenhum impacto na sociedade (80,6% do Grupo B contra 37,8% do Grupo A). É interessante avaliar que 100% das organizações que investem mais de R$ 50 mil/ano tiveram respostas positivas.
O resultado destas pesquisas demonstrou que, de fato, o grupo de organizações que investem em capacitação para seus funcionários e voluntários tem uma percepção maior do impacto social positivo de suas ações (62,2%) sem comparação ao grupo de instituições que não fazem tal investimento – 80,6% dos respondentes do Grupo B também acreditam que sua instituição tem baixo ou nenhum impacto na sociedade, enquanto essa percepção é de 37,8% dos respondentes do Grupo A.
Pode-se perceber que o desenvolvimento e o cumprimento de um plano estratégico estão cada vez mais presentes no dia a dia das instituições que promovem capacitações e, consequentemente, estão mais preparadas para atuar de maneira organizada. No grupo de organizações que não realizam capacitações aos seus funcionários e/ou voluntários, somente 14,5% afirmaram que conseguem cumprir ao menos metade de seu planejamento estratégico, em oposição a 85,5% que ressaltaram não conseguir cumprir o que foi planejado.
Em termos de faturamento médio anual das instituições participantes, 57,0% responderam ter receita de até R$ 500 mil por ano, e a minoria dos respondentes (8,1%) tem receita superior a R$ 10 milhões. Ao analisarmos o universo total da pesquisa, observamos que 64% dos participantes consideraram que, após o investimento em capacitação, seus projetos conseguiram captar mais recursos e parceiros. Ao fazer um recorte das ONGs que investem no mínimo R$ 5.000 por ano em capacitações, 85% delas observaram os impactos positivos dessa ação.