Tecnologia da Informação (TI) tem papel decisivo nas políticas de gestão de pessoas, processos e recursos. Assim como em outras esferas sociais, o Terceiro Setor também utiliza a tecnologia – por meio de colaboradores, parceiros e captadores – em praticamente todas as suas ações. A partir disso, somos convidados a refletir sobre a importância de se integrar a TI aos demais departamentos de uma organização. Mas sabemos que boa parte das ONGs ainda padece com a falta de recursos tecnológicos e, por isso, deixa de executar muitos de seus projetos.
Geralmente, isso acontece porque além da carência de ferramentas adequadas, questões mais urgentes, como a captação de recursos ou a solução de problemas financeiros, acabam se tornando prioridade na gestão de uma organização. Outras características internas, como frequentes mudanças na equipe, ausência de uma sede própria, muitos voluntários com poucas horas de envolvimento, entre outros pontos, exigem investimentos nos chamados sistemas colaborativos.
"Neste caso, se a inovação é vista como algo caro ou fora do orçamento, apenas o fato de se pesquisar mais e procurar conhecer melhor as tecnologias já existentes atenderia boa parte das carências encontradas no setor" – conforme sugere Valter Cegal, diretor de operações da Associação Telecentro de Informação e Negócios (ATN). Valter ainda explica que as organizações não precisam utilizar tecnologias atuais e complexas, já que podem fazer uso de ferramentas simples e gratuitas.
É necessário apenas que elas identifiquem as necessidades, extraiam ideias internas e engajem a organização no projeto. “Além de aumentar a visibilidade e a eficiência, a tecnologia gera comunicação entre os parceiros, clientes e patrocinadores; melhora a qualidade dos serviços prestados; permite a expansão em novas áreas; e propicia a redução de custos na prestação de serviços”, destaca o diretor.
Preocupada em contribuir com os avanços no setor, a ATN desenvolveu o programa TechSoup Brasil, que disponibiliza licenças e doações de empresas parceiras, como a Cisco, a Symantec e a Microsoft, às entidades do Terceiro Setor. Desde agosto de 2009 já foram beneficiadas mais de mil ONGs – totalizando cerca de US$ 12 milhões em licenças. Esses dados representam bons indícios, já que, segundo Rodolfo Fücher, diretor de Assuntos Corporativos da Microsoft Brasil, as instituições necessitam investir em tecnologias – assim como as organizações do mundo empresarial. “Elas são como qualquer empresa, e precisam atuar de forma eficiente para atender às demandas com que trabalham”.
Sendo assim, a grande questão é: quais são as ferramentas mais efetivas e como consegui-las? Foi pensando nisso que, em maio de 2010, criou-se o Instituto de Fomento à Tecnologia do Terceiro Setor (IT3S). A instituição apoia outras organizações a aperfeiçoarem seus processos, incrementarem sua eficiência e, consequentemente, aumentarem seu impacto e ações junto à sociedade – disseminando tecnologias que facilitem a informatização em organizações sociais.
Para Daniela Mattern, fundadora do IT3S, “a falta de tecnologias adequadas pode causar ineficiência e dificultar que as organizações alcancem seus objetivos. Essa necessidade ainda é pouco conhecida pelos doadores e investidores sociais”. Por isso, por meio de pesquisas, o Instituto identificou que as organizações possuem muitas semelhanças referentes às suas ações. O objetivo do IT3S, portanto, é envolvê-las em um processo colaborativo para a construção de ferramentas a fim de que elas possam atender a diferentes necessidades.
As ferramentas colaborativas são softwares que auxiliam no desenvolvimento de tarefas realizadas por um grupo, o qual busca, por meio do trabalho coletivo, cumprir um projeto ou um objetivo em comum. A partir da produção coletiva proporcionada por tais ferramentas, é possível compreender que novas formas de cooperação, construção do conhecimento, inteligência coletiva e atividades de colaboração podem ser potencializadas.
Neste caso, o suporte ao trabalho em grupo acontece na superação de limitações geográficas e temporais, de modo que o partilhar de informações possa ocorrer em qualquer tempo e lugar. Em geral, essas ferramentas permitem a comunicação através de chat, vídeo, audioconferência ou uma combinação desses recursos. Como apoio à produção coletiva, algumas ferramentas ainda possibilitam a interação por meio de funcionalidades de texto, quadro branco, diagramas, desenhos ou apresentações.
Segundo José Avando Souza Sales, diretor-geral da ATN, o uso dessas ferramentas garante uma gestão mais profissionalizada das ONGs e outras entidades do Terceiro Setor. “Cada vez mais é preciso ter transparência nas ações. Por exemplo, quando ocorrer uma captação de recurso, é preciso que seja claramente demonstrado como essas verbas são utilizadas. Assim como é preciso ter uma comunicação mais rápida com os doadores, e isso tudo pode ser obtido com ferramentas tecnológicas”, aponta.
Implementar uma cultura de colaboração não é tarefa fácil. “A colaboração é uma atividade crítica em muitos processos operacionais. E o modelo de colaboração extrema é essencialmente uma sala virtual ou um centro de crise para as pessoas se unirem e trabalharem em cooperação”, explica Janelle Hill, vice-presidente e analista da Gartner Group.
Por isso, é necessário conhecer as melhores práticas para a implementação de uma cultura colaborativa. Conheça, a seguir, as seis principais formas sugeridas pela Gartner:
Uma forma de estimular novas formas de colaboração é selecionar uma atividade atualmente tratada por meio de métodos tradicionais, como encontros pessoais ou e-mail, e incentivar sua execução virtual por meio da web. Por exemplo: ambientes virtuais podem incluir redes sociais ou ferramentas de colaboração.
A urgência da comunicação em tempo real, por meio de mensagens de texto, Twitter e Facebook, não é apenas uma moda passageira, e as organizações devem abraçar e incentivar tal comportamento. Estabelecer hábitos de comunicação em tempo real no ambiente de trabalho permite um fluxo mais livre de informações e notificações mais proativas, de modo que as pessoas possam responder rapidamente a eventos inesperados e interrupções no planejamento.
Isso pode resolver o problema comum da informação atrasada, enviada a partir de outros canais, já que a comunicação em tempo real pode quebrar comportamentos de contar com a hierarquia de gestão para distribuir informação de forma adequada e, assim, ajudar a superar alguns dos desafios relacionados à comunicação organizacional.
Uma boa maneira de iniciar a mentalidade de colaboração é desencadear uma comunidade dinâmica para discutir sobre um problema. Isso envolve definir um tema e incentivar as pessoas a participarem e começarem a trabalhar. Ao contrário de uma conversa em uma sala de reuniões, toda comunicação é capturada. Por isso, há um claro registro do que foi discutido, o que contribuiu com ideias e levou à resolução de problemas.
Métodos atuais de gerenciamento de desempenho são ineficazes para processos centrados em organizações, pois eles desencorajam a colaboração ao premiar os esforços individuais em vez de apoiar este comportamento, que oferece recompensas aos esforços da equipe. O uso de tecnologias de colaboração também torna mais fácil acompanhar o comportamento colaborativo e alinhá-lo aos resultados alcançados.
Outra maneira de medir e recompensar o comportamento colaborativo é rastrear como as pessoas interagem. A análise de redes sociais (SNA) monitora a influência social de uma pessoa. Uma cultura de colaboração extrema é construída com base em respeito, confiança e abertura. SNA é uma técnica para melhorar processos de negócios e identificar líderes fortes nas mídias sociais.
A Gartner ainda lista alguns passos para que as organizações, de fato, ingressem na era da colaboração:
A convergência entre os diferentes meios de comunicação está trazendo grandes conquistas e novidades para o Terceiro Setor. Um único canal global de informação é formado quando TV, rádio, cinema, jornais e a própria internet convergem, potencializando as formas como se dão as trocas de informações. Neste ambiente, a web é a ferramenta para a conexão de pessoas, ideias, recursos e mercados, formando uma grande força de globalização, democratização e inovação social.
Neste cenário, as novas mídias são utilizadas pelos movimentos sociais para comunicar e tornar as pessoas mais conscientes. Os usuários da web estão próximos, apesar das distancias físicas, e podem trabalhar em assuntos de interesse comum, que irão beneficiar um grupo de pessoas ou uma comunidade.
Entre as tendências inseridas neste ambiente está a do crowdsourcing, conceito que envolve colaboração em massa e defende a abertura corporativa na criação de produtos ou ideias. De forma bastante resumida, o processo começa com o open call de um indivíduo ou grupo relativamente pequeno de pessoas – crowdsourcer – chamando um grupo maior de pessoas de sua escolha a contribuir com informações e dados para um objetivo específico. Pode ser a necessidade de resolução de um problema, a construção de um novo produto ou a captação de fundos para um projeto específico.
Existem elementos de incentivo criados neste sistema a fim de motivar o público a contribuir com material e um processo de filtragem de ideias. O resultado e conhecimento moldados podem ser posteriormente abertos para o público. E os benefícios são enormes, como destaca Marina Miranda, especialista em crowdsourcing: “Podem ir desde a simples redução de custos (que é um subuso do crowdsourcing) à geração de novas ideias, ganhos de produtividade, captação de recursos ou qualidade na produção criativa. Tudo depende do modelo adotado. O importante é entender o que é o crowdsourcing e a abrangência que ele representa antes de iniciar”.
Já vimos alguns exemplos de ferramentas e de como implementar uma cultura de colaboração no Terceiro Setor. Mas, de que forma a tecnologia pode otimizar na prática o trabalho das organizações? Acompanhe alguns exemplos nos cases a seguir:
Caso AACD: Em 2010, a AACD completou 60 anos e realizou uma transmissão especial do Teleton. Na ocasião, muitas histórias foram exibidas para o público – entre elas a do paciente Eduardo dos Santos George, que trabalha e se relaciona como qualquer pessoa através do uso do computador. Graças ao apoio de empresas como a Microsoft (que realizaram doações de licenças de software), a AACD pode oferecer ao Eduardo e a tantos outros pacientes ferramentas que ajudam a otimizar o atendimento e, principalmente, favorecer o bem-estar de todos os envolvidos.
Caso POETA: A ONG Trust for the Americas, braço social da organização dos Estados Americanos (OEA), em parceria com a Microsoft e a Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência (AVAPE) inaugurou no Brasil o primeiro Centro do Programa Parcerias para Oportunidades de Emprego através da Tecnologia nas Américas (POETA). O principal objetivo do centro é prover treinamentos em tecnologia da informação para pessoas com deficiência a fim de qualificá-las para o mercado de trabalho. Além dos recursos de acessibilidade disponíveis no próprio Windows, as ferramentas permitem fácil adaptação às chamadas tecnologias assistivas – necessárias para a inclusão digital de pessoas com necessidades especiais.
Caso Parceiros Voluntários: A maior necessidade de quem coordena projetos e organizações sociais é ter processos definidos e transparentes. A Parceiros Voluntários, em 2007, propôs o desafio de desenvolver uma solução web que disponibilizasse para toda a sociedade uma ferramenta que apoiasse os processos de gestão e estímulo à formação de redes colaborativas. Iniciou-se, então, a solução Visão Integral do Voluntariado. A ferramenta de gestão pretendia ir além de apoiar os processos de gestão de voluntários e visava aumentar a visibilidade e o alcance do movimento.
Caso Instituto Crescer: Receber a doação de softwares é um passo importante para aprimorar a gestão de ONGs e telecentros. O Instituto Crescer desenvolveu um currículo específico para explorar os recursos tecnológicos no contexto de cada instituição e aproveitou a oportunidade para criar uma discussão mais ampla com o foco na elaboração de projetos – principalmente para apresentar aos investidores em potencial estratégias para a comunicação de suas ações e práticas para gestão dos recursos. Como resultado, as instituições se sentiram mais fortes para participar da sociedade contemporânea e mais preparadas para cumprir suas missões na busca pela sustentabilidade.