Alterações Nas Regras De Captação De Recursos Públicos

Por: José Alberto Tozzi
15 Setembro 2016 - 04h18

Lei n.º 13.019/14, alterada pela Lei n.º 13.204/15, muda conceito de parcerias com poderes públicos

Atualmente, o Terceiro Setor vivencia um forte movimento de regulação para ampliar sua capacidade de desenvolver vantagens competitivas, especialmente com as novidades nas formas de captação de recursos que têm se proliferado em chamamentos públicos (para verbas públicas) e em editais (verbas privadas).

O acesso aos recursos, porém, envolve cada vez mais disputas nos âmbitos de qualidade e de custo.

Isso amplia a necessidade de controle e gestão, o que obriga as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) a se adaptarem às novidades para não ficarem fora do mercado.

Nesse contexto, foi aprovada a Lei n.º 13.019/141, que regulariza as parcerias voluntárias, com ou sem transferência de recursos financeiros, entre a administração pública e as OSCs, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público.

Mas sua entrada em vigor foi prorrogada até a publicação da Lei n.º 13.204/152 que, além de alterar os prazos de vigência, trouxe uma série de modificações no texto da lei original.

A seguir, apresentam-se as principais alterações e os impactos trazidos por essa legislação à prática diária das OSCs e dos entes federados:

  1. Vigência: a vigência para os municípios foi escalonada, mantendo para 1.º de janeiro de 2016 a entrada em vigor para os recursos federais, estaduais e do Distrito Federal; e aos recursos municipais, o prazo foi para 1.º de janeiro de 2017, facultando a implementação da lei a partir de 23 de janeiro de 2016 por ato administrativo próprio.
  2. Parcerias: foram incluídas as cooperativas que atuam com vulnerabilidade social e as cooperativas sociais de combate à pobreza e geração de trabalho e renda. Também se instituiu o acordo de cooperação (parceria sem transferência de recursos).

O artigo 2A determina que "as parcerias disciplinadas nesta Lei respeitarão [...] as normas específicas das políticas públicas setoriais relativas ao objeto da parceria e as respectivas instâncias de pactuação e deliberação", o que significa reconhecimento das políticas sociais estabelecidas.

Ainda nessa linha, incluiu a consulta aos conselhos setoriais de políticas públicas e a administração pública quanto a políticas e ações voltadas ao fortalecimento das relações da parceria, além de promover a participação, nas comissões de seleção e de monitoramento e avaliação, de pelo menos um servidor efetivo ou empregado permanente da administração pública. Daí, subentende-se que qualquer cidadão poderá participar dessas comissões:

  1. Chamamento público: foi incluído o conceito de territorialidade, que limita geograficamente o chamamento em casos de organizações sediadas ou atuantes em determinada localidade por imperativos das políticas públicas. Estabeleceu-se também a isenção de chamamento público para as transferências em casos que envolvam recursos decorrentes de emendas parlamentares às leis orçamentárias anuais e aos acordos de cooperação, bem como acrescentou a dispensa de chamamento público para atividades de educação, saúde e assistência social, caso a OSC esteja previamente credenciada pelo órgão gestor da respectiva política. Isso pressupõe que deverá haver o cadastro das OSCs habilitadas para a execução dessas políticas públicas. Considerando que pelo menos no âmbito municipal a maioria absoluta dos recursos é destinada a essas três políticas públicas, é de se supor que parte substancial dos termos de colaboração seja assinada sem a necessidade de chamamento público, o que, no entanto, não exclui a obrigatoriedade de seguir as determinações previstas na lei. O plano de trabalho a ser apresentado no chamamento público foi simplificado, retirando exigências como: comprovação da compatibilidade dos custos com os preços de mercado, plano de aplicação dos recursos, estimativa dos encargos sociais, cronograma de desembolsos, modo, periodicidade e prazos para análise das prestações de contas.
  2. Seleção e celebração: a nova lei escalona o tempo mínimo de existência exigido para as OSCs (um ano para recursos municipais; dois anos para estaduais; e três anos para recursos da União, admitida a redução desses prazos por ato específico de cada ente na hipótese de nenhuma organização atingi-los). Foi excluído o item que exigia documento que evidenciasse a situação das instalações e as condições materiais da entidade, quando estas forem necessárias para a realização do objeto pactuado.
  3. Formalização e execução: a atuação em rede foi simplificada e a OSC deve comunicar à administração pública em até 60 dias a assinatura do termo de atuação em rede.

Foi revogada a obrigatoriedade do regulamento de compras e contratações, o que, em um primeiro momento, parece bom e desburocratizante, mas preocupa na medida em que a lei tem critérios rígidos para não pagamento de servidores públicos a qualquer título e a utilização dos recursos em finalidade alheia ao objeto da parceria. A pergunta que permanece é: como os gestores responsáveis pela parceria terão certeza da utilização adequada dos recursos sem um procedimento de controle e gestão? Considera-se, portanto, que, mesmo não obrigatório, seria salutar que a OSC tivesse um regulamento de compras e contratações simples e aplicável a todas as suas atividades, independentemente da origem dos recursos. Também foi revogada a obrigatoriedade de manutenção de Conselho Fiscal, perda significativa aos conceitos de transparência e gestão.

Manteve-se, porém, a obrigatoriedade de que a OSC com objetivos voltados à promoção de atividades e finalidades de relevância pública e social siga as Normas Brasileiras de Contabilidade e preveja, em caso de dissolução, a transferência do patrimônio remanescente a outra pessoa jurídica com os mesmos objetivos e que preencha os requisitos da lei. A novidade é que isso deve estar estabelecido em normas de organização interna, e não necessariamente no estatuto. Também foi mantida a obrigação de conta corrente em banco público, com isenção da tarifa bancária, permitindo desembolsos em espécie em caso de impossibilidade, comprovada, de pagamento pelo banco.

Revogou-se também a obrigatoriedade de a OSC inserir cláusula, no contrato que celebrasse com fornecedor de bens ou serviços com a finalidade de executar o objeto da parceria, que permitisse o livre acesso de servidores ou de empregados dos órgãos ou das entidades públicas repassadoras dos recursos públicos, bem como dos órgãos de controle, aos documentos e registros contábeis da empresa contratada.

  1. Ações compensatórias: a lei possibilita à OSC a solicitação de autorização para a administração pública a fim de ressarcir o erário, após a exaustão da fase recursal, por meio de ações compensatórias, o que não significa, na prática, a devolução do recurso em dinheiro.
  2. Extinção do título de Utilidade Pública Federal: estenderam- se os benefícios previstos na lei de Utilidade Pública Federal e Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) a todas as entidades sem fins lucrativos, e revogou a lei que instituiu a Utilidade Pública Federal. A lei da Oscip foi mantida, mas com várias alterações.
  3. Legislação complementar: um fator essencial à aplicação da lei é sua regulamentação em todas as instâncias dos entes federados.

Ou seja, deve-se publicar decretos federais, estaduais e municipais que adaptarão os termos da lei, naquilo que for pertinente, à realidade de cada ente federado.

Tendo em vista as mudanças exigidas pela nova lei, sugere-se a adoção de medidas para a implantação dos novos conceitos:

  1. Prazos: apesar da prorrogação da vigência da lei, nos municípios, devem-se analisar as exigências para adaptação paulatina. Não se pode esquecer que mudanças estruturais precisam ser feitas o quanto antes para permitir sua adaptação.
  2. Conscientização: fator que pode impedir a implantação desse processo e inviabilizar a OSC em um futuro próximo.
  3. Caso a entidade dependa de recursos públicos, as mudanças são obrigatórias para a sobrevivência da OSC.
  4. Visão sistêmica: é preciso pensar em um processo com o envolvimento de diversas áreas e pessoas na OSC. Considera-se que o recurso restrito deve ser controlado em todo o seu movimento na entidade.
  5. Todas as áreas envolvidas devem ter noção clara do processo.
  6. Planejamento: papel da contabilidade e do controle financeiro na gestão da OSC, projetos para o próximo ano, volume necessário de recursos, natureza dos recursos (restritos ou irrestritos), informações para prestação de contas.
  7. Estruturação: os recursos restritos devem ser controlados separadamente, tanto nas receitas e despesas quanto nos ativos e passivos. Portanto, o plano de contas precisa prever essa segregação. Cada projeto deve ser um centro de resultados, controlando entradas e saídas daquele recurso restrito.
  8. Acompanhamento: deve haver responsabilidades, prazos, cobranças e reuniões periódicas entre os envolvidos (governança interna) no nível operacional. São esses resultados avaliados internamente que alimentarão a governança estatutária da OSC para tomada de decisões estratégicas.

1A Lei n.º 13.019/2014 está disponível, na íntegra, em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13019.htm>;. Acesso em: 15 jun. 2016.
2A Lei n.º 13.204/2015 está disponível, na íntegra, em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13204.htm>;. Acesso em: 15 jun. 2016.

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